O leilão da hidrelétrica de Três Irmãos, a maior usina do rio Tietê, será um marco na história do setor elétrico. Inaugurada em 1993, a hidrelétrica foi construída pela Cesp, mas a estatal paulista está, neste momento, prestes a devolvê-la à União. Será a primeira vez que uma hidrelétrica antiga de grande porte retornará ao poder concedente e será relicitada dentro do novo modelo estabelecido por Brasília.
A partir de agora, os concessionários das hidrelétricas já amortizadas só receberão pelos serviços de operação e manutenção (O&M). Vencerá a licitação quem oferecer a menor tarifa, como já tem sido feito no leilão das novas hidrelétricas. No caso da Cesp, as tarifas estabelecidas na proposta de renovação das concessões para as usinas de Três Irmãos e Ilha Solteira, que operam interligadas no mesmo complexo, ficou em torno de R$ 6 por MWh, sem encargos e impostos. Não está escrito se essa será a tarifa do leilão, mas é esperado que o governo mantenha a mesma proposta feita à Cesp - e recusada pela geradora.
Segundo o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), braço de planejamento do Ministério de Minas e Energia, Maurício Tolmasquim, ainda não foi definida uma data para o leilão de Três Irmãos, mas é possível que ele ocorra no fim do primeiro semestre, ou início do segundo. "O que dá para dizer com mais certeza é que será neste ano." Apesar das baixas tarifas, 70% menores que as cobradas pela Cesp até hoje, não devem faltar interessados nas usinas da estatal paulista. "Com certeza, haverá interessados", afirma João Carlos Mello, presidente da firma de consultoria Thymos.
Fontes consultadas pelo Valor afirmam que as empresas que aparecem como candidatas mais fortes no leilão de Três Irmãos são a CPFL e a Tractebel. Nos bastidores, as listas de potenciais interessados também incluem a chinesa State Grid e a alemã E.On, sócia de Eike Batista na MPX, além do grupo Desenvix, que opera pequenas centrais hidrelétricas e eólicas. Mesmo a estatal mineira Cemig, que não aceitou os termos para a renovação das suas concessões, poderia ter interesse nos ativos da Cesp, diz uma fonte.
Sobre a participação das empresas do grupo Eletrobras nos leilões, as expectativas são que a estatal federal não seja mais tão agressiva quanto era antes. Depois de anunciar no quarto trimestre um prejuízo de mais de R$ 10 bilhões, o maior da história do país entre as empresas de capital aberto, a Eletrobras já tem muito com o que se preocupar.
Os contornos políticos do leilão de Três Irmãos são inegáveis. A licitação da usina servirá como uma reafirmação da política da presidente Dilma Rousseff, que prometeu reduzir a conta de luz em 20% em média a partir deste ano. A meta, porém, ficou parcialmente comprometida depois que os Estados de São Paulo, Minas Gerais e Paraná não aderiram à programa de renovação das concessões. Também são grandes as chances de que o governo federal transfira a Cesp, ou pelo menos uma parte considerável da geradora de energia, para a iniciativa privada. Ironicamente, se isso ocorrer, o PT fará o que o PSDB nunca conseguiu e sempre quis fazer ao longo dos últimos dez anos: privatizar a Cesp.
Neste momento, a União negocia com o governo paulista a remuneração que a estatal receberá por operar e manter Três Irmãos até que a usina seja relicitada, diz Tolmasquim. Só depois de acertados esses termos, a hidrelétrica será oficialmente devolvida à União, processo que deve estar concluído em breve. Com isso, a Cesp irá receber a indenização que foi definida pelo governo federal para ressarci-la pelos investimentos ainda não amortizados. Mas esse é outra questão que ainda deve render atritos: a estatal paulista alega ter direito a R$ 3,5 bilhões, enquanto o governo disse que pagará apenas R$ 1,7 bilhão. Não se sabe se a Cesp aceitará o cheque e brigará pelo restante na Justiça.
O contrato de concessão de Três Irmãos já está vencido desde novembro de 2011. A Cesp terá de entregar também à União as usinas localizadas no rio Paraná: Ilha Solteira e Jupiá, cujas concessões terminam em julho de 2015.
Três Irmãos é a menor delas, com uma capacidade instalada de 811 MW e garantia física de 217 MW médios. A usina opera no mesmo complexo de Ilha Solteira, a terceira maior hidrelétrica do país, com 3,4 mil MW de capacidade instalada e 1,7 mil MW de garantia física. Jupiá possui uma capacidade de geração de 1,5 mil MW. Por ser bem maior, a expectativa é que Ilha Solteira atraia também um maior interesse dos geradores. Mas vencer a concessão de Três Irmãos pode ser considerado um passo estratégico, tendo em vista que as hidrelétricas praticamente dividem o mesmo lago, diz um consultor.
Procuradas, as empresas não confirmaram se participarão do leilão de Três Irmãos. A State Grid e a E.On responderam que não se pronunciam sobre rumores. A Desenvix, a Tractebel e a CPFL também disseram que não se manifestariam sobre o assunto. Em e-mail, a assessoria da Cemig respondeu que a empresa "analisa todas as oportunidades de adquirir novos ativos de geração, e participará do leilão daqueles que ela julgar vantajoso, o que inclui a usina de Três Irmãos, mas não há nenhum interesse específico nesse momento."
Mas o presidente da CPFL, Wilson Ferreira Júnior, não escondeu que vê uma oportunidade para expandir os negócios de geração, em teleconferência com analistas. "Somos um grande operador de hidrelétricas e, em todos os casos onde prestamos esse serviço, operamos com valores menores do que aqueles que foram apresentados como proposta para os atuais concessionários", disse Ferreira. "Haverá - e não havia até então - a oportunidades de operação e de manutenção de usinas que terão seu vencimento de concessões daqui a dois anos." (Valor Econômico)
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