Enquanto em 2008 vivemos a iminência de desabastecimento de eletricidade, agora vivemos a insegurança quanto ao custo da energia. Apesar de o consumo de energia em 2013 ter crescido menos do que previsto e as chuvas terem correspondido à média histórica de mais de 80 anos, o Brasil precisou de um intenso acionamento de usinas termelétricas para recuperar o nível dos reservatórios das hidrelétricas.
Felizmente, contamos com um parque termelétrico --concebido exatamente para essa finalidade-- que resolveu o problema de abastecimento. A pergunta que fica, no entanto, é a seguinte: olhando para o futuro, estaremos com a configuração de usinas que otimizará os custos de geração de energia?
O tema é complexo. O país conta com milhares de usinas de geração de energia de diferentes tipos. Dispõe de milhares de quilômetros de linhas de transmissão interligando as usinas aos pontos de consumo. Tem na base de sua matriz elétrica a hidroeletricidade, fonte sujeita às incertezas derivadas do volume das chuvas que abastecem os reservatórios das usinas. Essas características são representadas em modelos computacionais usados no planejamento da expansão e na operação do sistema elétrico nacional.
O desafio de operar esse sistema é crescente: a energia armazenada nos reservatórios hidrelétricos é suficiente para atender a períodos cada vez menores. Em 2000, os reservatórios armazenavam o suficiente para seis meses de consumo, número que hoje excede por pouco quatro meses.
Diante desse quadro, a operação do sistema se defronta com o seguinte dilema: a) acreditar piamente nos modelos computacionais desenhados para otimizar a operação futura ao menor custo; ou b) agir mais conservadoramente, poupando água nos reservatórios com um acionamento termelétrico mais acentuado e prolongado, porém a um custo maior.
Para verificar se os modelos computacionais representam a realidade, simulamos dois anos de operação do sistema com base em dados reais do nível inicial dos reservatórios, do consumo de energia e das chuvas de fato ocorridas. Se os modelos fossem precisos, indicariam ao fim do período um nível de reservatórios coincidente ou, pelo menos, próximo ao que se observou na realidade. Não foi o que aconteceu.
Os modelos foram sempre otimistas, apontando para níveis de reservatórios ao final do período maiores do que os observados na prática. Por que essa disparidade? As duas explicações possíveis seriam inadequações no desenho dos próprios modelos computacionais ou imprecisões nos parâmetros de entrada inseridos nos modelos, entre os quais a energia realmente produzida por cada usina e o volume útil dos reservatórios.
Outra constatação se refere à inadequação do parque instalado de termelétricas. Praticamente metade desse parque é de usinas de baixo investimento para instalação, mas de elevado custo operacional quando acionadas.
Essa proporção seria adequada no passado, quando a capacidade de regularização de nossos reservatórios era maior e as termelétricas seriam mais acionadas somente em situações de secas severas. Mas essa não é mais a condição de operação atual nem a que podemos projetar para o futuro: as termelétricas deverão continuar a ser usadas de forma mais intensa.
Os atuais leilões de energia, que só levam em conta a menor tarifa por quantidade de energia, devem ser aprimorados para valorizar também atributos como localização e flexibilidade operacional (capacidade e rapidez de acionamento sob demanda) das usinas ao longo das 24 horas do dia e dos 365 dias do ano.
Tanto a diminuição da imprecisão dos modelos computacionais quanto aprimoramentos nos leilões de energia são essenciais para um abastecimento de eletricidade mais seguro e ao menor custo possível. CLAUDIO J. D. SALES, 66, engenheiro industrial, é presidente do Instituto Acende Brasil. (Folha de S. Paulo)
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