O mercado livre de energia, onde são negociados 27% de toda a eletricidade consumida no país, busca hoje um acerto de contas com o passado. Além de um impacto imediato de até R$ 100 milhões no caixa das empresas, a diretoria da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) deverá tomar nesta manhã uma decisão que influenciará diretamente as perspectivas de crescimento do mercado livre. Mais de mil grandes consumidores, além de dezenas de geradoras e comercializadoras, estão de olho na reunião.
A polêmica gira em torno de um dos principais indicadores do mercado, o preço de liquidação das diferenças (PLD), que é fixado semanalmente pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). Esse valor é usado nas negociações em que empresas vendem "sobras" de energia contratada a outras que precisam de eletricidade "extra" para satisfazer suas necessidades de consumo, e vice-versa. Além disso, o chamado PLD também serve como referência para os preços estabelecidos em contratos de duração média, de um a seis meses. Empresas cuja demanda supera 3 megawatts (MW) podem ir ao mercado livre, sem a obrigatoriedade de manter-se clientes das distribuidoras de energia da região onde atuam.
A confusão surgiu porque, devido a correções nos modelos matemáticos que calculam semanalmente o preço da energia no mercado de curto prazo, o PLD foi recalculado semanas, e às vezes até meses, depois de grandes transações de compra e venda terem sido pagas e liquidadas. Desde 2008, segundo a Cemig, isso ocorreu pelo menos 15 vezes.
As razões para corrigir os preços do passado variam - da quantidade de chuvas ao custo real de geração de térmicas a gás -, mas o resultado é o mesmo: as mudanças criam insegurança jurídica para os agentes do mercado. O assunto vinha causando incômodo às empresas há tempos, mas elas só engrossaram o tom de voz no ano passado, quando a Aneel determinou a correção do PLD vigente durante 39 semanas, entre fevereiro e outubro de 2010. Em recurso encaminhado à agência, que acabou suspendendo temporariamente o recálculo de preços e manteve os valores originais, sete grandes associações do setor elétrico fizeram as contas sobre o possível impacto financeiro da mudança.
"Estima-se que um montante de R$ 100 milhões trocará de mãos caso o PLD do período de janeiro a março seja recontabilizado", diz um ofício conjunto assinado, entre outras, pela Abraceel (entidade que reúne comercializadores), Abrace (consumidores livres), Apine (produtores independentes de energia) e Abiape (indústrias autoprodutoras). "Um grupo de agentes terá pleno direito de questionar na Justiça o direito de receber R$ 100 milhões de reais em função dos novos preços, enquanto outro grupo de agentes terá pleno direito de questionar na Justiça o não pagamento de R$ 100 milhões, alegando que executaram de boa-fé seus contratos", afirma.
O presidente da Abraceel, Reginaldo Medeiros, adverte que o recálculo de preços pode afetar a relação e os montantes envolvidos entre credores e devedores, além de complicar a contabilidade das empresas, que já tiveram seus balanços financeiros publicados naquele período. "Cria-se uma incerteza jurídica que atrapalha o funcionamento do mercado livre."
Em sua decisão de hoje, a Aneel decidirá se o recálculo do preço da energia entre janeiro e março de 201 será definitivamente suspenso, em primeiro lugar. Mas deve também definir, de forma mais ampla, como e em que circunstâncias os preços do passado podem mudar. A decisão é vista como uma das mais relevantes dos últimos anos, para o mercado livre.
"Há uma quantidade enorme de informações para a formação do PLD e isso às vezes implica recálculos, mas falta transparência e a correção para trás pode causar mais estresse do que a manutenção do erro", diz João Carlos de Oliveira Mello, presidente da consultoria Andrade&Canellas. Para ele, não é saudável mexer nos preços do passado, até porque eles foram aceitos em negociações bilaterais.
O curioso é que, na análise preliminar do caso, as áreas técnicas da Aneel encararam a questão de formas diferentes. A Procuradoria da agência reforça o entendimento das associações empresariais e sublinha a "inconveniência jurídica" de recalcular preços. Já as superintendências de estudos de mercado e de regulação da geração são a favor de manter o mecanismo de recálculo tal como ele funciona hoje. (Valor Econômico)
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A polêmica gira em torno de um dos principais indicadores do mercado, o preço de liquidação das diferenças (PLD), que é fixado semanalmente pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). Esse valor é usado nas negociações em que empresas vendem "sobras" de energia contratada a outras que precisam de eletricidade "extra" para satisfazer suas necessidades de consumo, e vice-versa. Além disso, o chamado PLD também serve como referência para os preços estabelecidos em contratos de duração média, de um a seis meses. Empresas cuja demanda supera 3 megawatts (MW) podem ir ao mercado livre, sem a obrigatoriedade de manter-se clientes das distribuidoras de energia da região onde atuam.
A confusão surgiu porque, devido a correções nos modelos matemáticos que calculam semanalmente o preço da energia no mercado de curto prazo, o PLD foi recalculado semanas, e às vezes até meses, depois de grandes transações de compra e venda terem sido pagas e liquidadas. Desde 2008, segundo a Cemig, isso ocorreu pelo menos 15 vezes.
As razões para corrigir os preços do passado variam - da quantidade de chuvas ao custo real de geração de térmicas a gás -, mas o resultado é o mesmo: as mudanças criam insegurança jurídica para os agentes do mercado. O assunto vinha causando incômodo às empresas há tempos, mas elas só engrossaram o tom de voz no ano passado, quando a Aneel determinou a correção do PLD vigente durante 39 semanas, entre fevereiro e outubro de 2010. Em recurso encaminhado à agência, que acabou suspendendo temporariamente o recálculo de preços e manteve os valores originais, sete grandes associações do setor elétrico fizeram as contas sobre o possível impacto financeiro da mudança.
"Estima-se que um montante de R$ 100 milhões trocará de mãos caso o PLD do período de janeiro a março seja recontabilizado", diz um ofício conjunto assinado, entre outras, pela Abraceel (entidade que reúne comercializadores), Abrace (consumidores livres), Apine (produtores independentes de energia) e Abiape (indústrias autoprodutoras). "Um grupo de agentes terá pleno direito de questionar na Justiça o direito de receber R$ 100 milhões de reais em função dos novos preços, enquanto outro grupo de agentes terá pleno direito de questionar na Justiça o não pagamento de R$ 100 milhões, alegando que executaram de boa-fé seus contratos", afirma.
O presidente da Abraceel, Reginaldo Medeiros, adverte que o recálculo de preços pode afetar a relação e os montantes envolvidos entre credores e devedores, além de complicar a contabilidade das empresas, que já tiveram seus balanços financeiros publicados naquele período. "Cria-se uma incerteza jurídica que atrapalha o funcionamento do mercado livre."
Em sua decisão de hoje, a Aneel decidirá se o recálculo do preço da energia entre janeiro e março de 201 será definitivamente suspenso, em primeiro lugar. Mas deve também definir, de forma mais ampla, como e em que circunstâncias os preços do passado podem mudar. A decisão é vista como uma das mais relevantes dos últimos anos, para o mercado livre.
"Há uma quantidade enorme de informações para a formação do PLD e isso às vezes implica recálculos, mas falta transparência e a correção para trás pode causar mais estresse do que a manutenção do erro", diz João Carlos de Oliveira Mello, presidente da consultoria Andrade&Canellas. Para ele, não é saudável mexer nos preços do passado, até porque eles foram aceitos em negociações bilaterais.
O curioso é que, na análise preliminar do caso, as áreas técnicas da Aneel encararam a questão de formas diferentes. A Procuradoria da agência reforça o entendimento das associações empresariais e sublinha a "inconveniência jurídica" de recalcular preços. Já as superintendências de estudos de mercado e de regulação da geração são a favor de manter o mecanismo de recálculo tal como ele funciona hoje. (Valor Econômico)
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