quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Um preocupante começo de ano

2011 começou mal para a competitividade da cadeia produtiva brasileira, que recolhe boa parte de um valor aproximado de R$ 15 bilhões ao ano sob a forma de encargos incidentes sobre o consumo de energia elétrica. Esse montante bastaria para financiar toda a expansão da oferta de energia adicional anual do País. Mas a apuração e a viagem desse herbanário até seu uso são opacos e discutíveis sob o ponto de vista ético e político. A duração do processo é imprevisível. Seu controle, pífio. Aqueles que recebem esses reais já os gastam por conta.

Perto do último semestre, prorrogou-se a vida e intensificou-se a incidência sobre a fatura dos kWh vendidos no país do encargo da Conta de Combustíveis (CCC) que beneficia os sistemas eletricamente isolados, basicamente na Região Norte do Brasil.

No último dia de 2010, medida provisória prorrogou a cobrança da condenada Reserva Global de Reversão (RGR), um encargo quase sexagenário cujos fundos se destinam a custear alvos semelhantes aos de Proinfa (fontes alternativas), CDE (contribuição ao desenvolvimento econômico), CCC e outros. A morte da RGR era ansiosamente aguardada para 31 de dezembro de 2010. Sua necessidade filosófica sucumbira havia décadas.

Isso significa que o governo petista-peemedebista, em conluio com os legisladores, não mostra sensibilidade às agruras da cadeia produtiva, aos riscos de desindustrialização e ao excesso de encargos e tributos (que na energia elétrica aproximam-se de 50% do valor da fatura).

Isso mostra o que já se via na bancada da Região Norte: que a diferença regional é tratada como enfermidade, não como colapso crônico de gestão (pode-se comparar o atraso de alguns estados do norte às agruras de países africanos dominados por governos tribais, oligarcas e corruptos, em boa parte responsáveis pela pobreza e má distribuição de oportunidades).

Recorde-se que os escravos africanos enviados ao Brasil eram caçados por líderes locais e entregues aos mercadores negreiros.

Os recentes desenvolvimentos do nordeste e mormente do centro-oeste demonstram que políticas públicas e empreendedorismo são de longe melhores do que paternalismo, clientelismo, patrimonialismo e coronelismo.

Alguns influentes políticos e líderes do norte, porém, continuam manejando a fraqueza autóctone num circuito esquizofrenogênico que falseia a sensação de que o Brasil é o culpado pelas dificuldades locais. No universo nacional, os falaciosos marqueteiam de modo a que o norte aparente desejar que todos lhe sejam adictos.

Mas sua ação paroquial e umbilical não é pior do que o movimento legislativo pela ressurreição da CPMF para suportar a saúde pública. O fato lembra a rainha Maria Antonieta, da França, que ignorou os protestos dos parisienses agoniados por dificuldades. De que carece o Congresso Nacional para acordar da Derrama, uma Inconfidência Mineira no século XXI? Vê-se aqui a mesma falta de aderência às vontades daqueles que trabalham e criam de fato as riquezas brasileiras. Vide os autoaumentos salariais que recentemente se aplicaram: darão brioches ao populacho?

A RGR que ganhou sobrevida até 2035 mantinha nos cofres da Eletrobras, em estimativa, mais de R$ 10 bilhões, cujos critérios de distribuição e prestação de contas ao público são pouco ou nada divulgados. A quem interessa esse manejo? Aos investidores na Bolsa de Nova York? Onde está o dinheiro do sequestro de carbono do Proinfa? E como vai a devolução dos Empréstimos Compulsórios? O Tribunal de Contas de União já referendou as contas da CCC?

Enfim, não são alvissareiras as primeiras notícias de 2011 para os agentes do setor elétrico brasileiro. Entre eles há estadistas que lutam por uma ordem e uma racionalização na qual todos se ajustam. E o Brasil depende de gente que não varra seu quintal para debaixo do tapete vizinho. Depende de líderes comprometidos com o coletivo, mais com a produção do que com o lazer. (DCI) Autor: Paulo Ludmer

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