A troca de energia hidrelétrica entre Brasil e Argentina, considerada onerosa por agentes do mercado brasileiro, tende a evoluir para um modelo de mercado, mais próximo do que é feito em outros países limítrofes, como Estados Unidos e Canadá. O diretor geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), Hermes Chipp, disse que até o fim deste ano deverá estar pronto o estudo técnico para o que ele chama de "evolução" do intercâmbio energético que abrange também as trocas entre Brasil e Uruguai. Concluído o estudo, ele terá que passar pela negociação política entre os países.
Segundo Chipp, o trabalho está sendo feito no âmbito do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE), sob coordenação do Ministério de Minas e Energia (MME). A proposta, diz ele, é criar um sistema de oferta de volume-preço na fronteira, segundo parâmetros que contemplem o risco energético do fornecimento (o quanto o país fornecedor fica vulnerável a um problema de oferta interna ao exportar) e o custo dos investimentos feitos para gerar aquela energia.
Nas duas últimas semanas, Chipp tem duelado, em correspondências ao Valor, com o presidente do Instituto Acende Brasil, instituição de estudos setoriais patrocinada pelas empresas do setor elétrico, Claudio Sales, sobre o tema. A exportação de energia do Brasil - mais de 90% vai para a Argentina - é feita de três formas: energia de geração térmica a preço de mercado; energia hidrelétrica gerada por água que seria vertida (passada por fora das turbinas) por falta de demanda doméstica; e energia hidrelétrica normal, trocada por energia da mesma fonte a ser produzida no futuro.
As duas primeiras modalidades não causam maiores controvérsias. O problema concentra-se na parte de troca que, garante Sales, é negativa, enquanto Chipp sustenta que é neutra ou positiva. Segundo ele, a modalidade de troca, com o Brasil fornecendo de maio a agosto e recebendo de setembro a novembro, é precificada com base no Preço de Liquidação de diferenças (PLD), o preço do mercado livre do Brasil, calculado pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE).
Segundo ele, se o PLD estiver mais alto na época da devolução da energia e houver saldo positivo no balanço, as geradoras brasileiras recebem a diferença. Caso contrário, fica tudo zero a zero, na conta da cooperação mútua. Sales argumenta que o PLD é um preço interno que leva em conta "o retrato da operação em determinado momento" e diz que os vizinhos estão desfrutando de um "condomínio" que não pagaram para ser criado. Ele sugere um preço que saia, por exemplo, da média entre quanto os argentinos ou uruguaios pagariam por geração térmica se não tivessem a energia brasileira e o preço das térmicas que estiverem ligadas no Brasil no momento da oferta.
Sales também critica o fato de a energia ser fornecida em caráter "excepcional" desde 2004, embora o aumento de consumo dos vizinhos no inverno seja uma rotina.
Mario Veiga, da PSA Consultoria, acha que as duas partes têm razão. O governo, ao dizer que em condições normais não há prejuízo para o Brasil, e o mercado, ao dizer que não é emergência e que o Brasil investiu para ter segurança, ao contrário da Argentina, a maior compradora. Apesar do intenso debate e de o Brasil estar fornecendo perto de 1.000 megawatts diários aos vizinhos, o ONS informou que até agora toda a energia foi de geração térmica.
Na Argentina, especialistas garantem que o país continuará precisando importar energia elétrica do Brasil nos próximos anos. "Não há outra saída", diz Cecilia Laclau, coordenadora-geral da Fundação para o Desenvolvimento Elétrico (Fundelec). Durante algumas semanas do inverno, o equilíbrio entre oferta e demanda é tão tênue que, "se qualquer máquina ou turbina deixar de operar, pode comprometer a segurança de todo o sistema elétrico do país", explica Daniel Montamat, ex-secretário nacional de Energia. "No curto prazo, a importação do Brasil continuará sendo essencial."
Na quinta-feira à noite, a demanda de eletricidade da Argentina bateu recorde, com as temperaturas abaixo de zero em boa parte do país: 20.396 megawatts (MW). A transferência do Brasil também alcançou um máximo histórico na semana passada: 990 MW médios.
Na primavera, entre setembro e dezembro, a demanda cai para até 16 mil MW médios, permitindo à Argentina devolver energia ao Brasil. Como cerca de 58% da matriz elétrica do país é baseada em usinas térmicas (a gás e a óleo), o estoque de água dos reservatórios tem uma importância bem menor do que no sistema brasileiro. Na Argentina, cerca de 38% do parque gerador instalado é de energia hidrelétrica. O restante, perto de 4%, é de energia nuclear.
Montamat, que foi secretário entre 1999 e 2000, lembra a situação de pré-racionamento em que o Brasil se encontrava na época. Segundo ele, a integração do sistema elétrico beneficiou o Brasil naquela época, com a transferência de mais de 2 mil MW médios de eletricidade argentina. Na ocasião, afirma ele, ocorria o inverso: os argentinos reclamavam de pagar custos mais altos de geração para socorrer o vizinho. (Valor Econômico)
Segundo Chipp, o trabalho está sendo feito no âmbito do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE), sob coordenação do Ministério de Minas e Energia (MME). A proposta, diz ele, é criar um sistema de oferta de volume-preço na fronteira, segundo parâmetros que contemplem o risco energético do fornecimento (o quanto o país fornecedor fica vulnerável a um problema de oferta interna ao exportar) e o custo dos investimentos feitos para gerar aquela energia.
Nas duas últimas semanas, Chipp tem duelado, em correspondências ao Valor, com o presidente do Instituto Acende Brasil, instituição de estudos setoriais patrocinada pelas empresas do setor elétrico, Claudio Sales, sobre o tema. A exportação de energia do Brasil - mais de 90% vai para a Argentina - é feita de três formas: energia de geração térmica a preço de mercado; energia hidrelétrica gerada por água que seria vertida (passada por fora das turbinas) por falta de demanda doméstica; e energia hidrelétrica normal, trocada por energia da mesma fonte a ser produzida no futuro.
As duas primeiras modalidades não causam maiores controvérsias. O problema concentra-se na parte de troca que, garante Sales, é negativa, enquanto Chipp sustenta que é neutra ou positiva. Segundo ele, a modalidade de troca, com o Brasil fornecendo de maio a agosto e recebendo de setembro a novembro, é precificada com base no Preço de Liquidação de diferenças (PLD), o preço do mercado livre do Brasil, calculado pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE).
Segundo ele, se o PLD estiver mais alto na época da devolução da energia e houver saldo positivo no balanço, as geradoras brasileiras recebem a diferença. Caso contrário, fica tudo zero a zero, na conta da cooperação mútua. Sales argumenta que o PLD é um preço interno que leva em conta "o retrato da operação em determinado momento" e diz que os vizinhos estão desfrutando de um "condomínio" que não pagaram para ser criado. Ele sugere um preço que saia, por exemplo, da média entre quanto os argentinos ou uruguaios pagariam por geração térmica se não tivessem a energia brasileira e o preço das térmicas que estiverem ligadas no Brasil no momento da oferta.
Sales também critica o fato de a energia ser fornecida em caráter "excepcional" desde 2004, embora o aumento de consumo dos vizinhos no inverno seja uma rotina.
Mario Veiga, da PSA Consultoria, acha que as duas partes têm razão. O governo, ao dizer que em condições normais não há prejuízo para o Brasil, e o mercado, ao dizer que não é emergência e que o Brasil investiu para ter segurança, ao contrário da Argentina, a maior compradora. Apesar do intenso debate e de o Brasil estar fornecendo perto de 1.000 megawatts diários aos vizinhos, o ONS informou que até agora toda a energia foi de geração térmica.
Na Argentina, especialistas garantem que o país continuará precisando importar energia elétrica do Brasil nos próximos anos. "Não há outra saída", diz Cecilia Laclau, coordenadora-geral da Fundação para o Desenvolvimento Elétrico (Fundelec). Durante algumas semanas do inverno, o equilíbrio entre oferta e demanda é tão tênue que, "se qualquer máquina ou turbina deixar de operar, pode comprometer a segurança de todo o sistema elétrico do país", explica Daniel Montamat, ex-secretário nacional de Energia. "No curto prazo, a importação do Brasil continuará sendo essencial."
Na quinta-feira à noite, a demanda de eletricidade da Argentina bateu recorde, com as temperaturas abaixo de zero em boa parte do país: 20.396 megawatts (MW). A transferência do Brasil também alcançou um máximo histórico na semana passada: 990 MW médios.
Na primavera, entre setembro e dezembro, a demanda cai para até 16 mil MW médios, permitindo à Argentina devolver energia ao Brasil. Como cerca de 58% da matriz elétrica do país é baseada em usinas térmicas (a gás e a óleo), o estoque de água dos reservatórios tem uma importância bem menor do que no sistema brasileiro. Na Argentina, cerca de 38% do parque gerador instalado é de energia hidrelétrica. O restante, perto de 4%, é de energia nuclear.
Montamat, que foi secretário entre 1999 e 2000, lembra a situação de pré-racionamento em que o Brasil se encontrava na época. Segundo ele, a integração do sistema elétrico beneficiou o Brasil naquela época, com a transferência de mais de 2 mil MW médios de eletricidade argentina. Na ocasião, afirma ele, ocorria o inverso: os argentinos reclamavam de pagar custos mais altos de geração para socorrer o vizinho. (Valor Econômico)