A renovação dos contratos de concessão das empresas de energia elétrica deve vir acompanhada de uma mudança radical nas regras do setor. Está sendo estruturado em Brasília o fim dos reajustes anuais das tarifas, baseados nos índices de inflação. A ideia seria, a partir da prorrogação dos contratos, em 2015 e 2017, fazer apenas revisões tarifárias, a exemplo das que ocorrem hoje, de em cinco em cinco anos.
A medida vai na direção dos planos do ministro da Fazenda, Guido Mantega, que já manifestou interesse em desindexar a economia. Segundo fontes ligadas ao processo de renovação, ainda não está definido qual seria o prazo ideal para fazer as revisões tarifárias. Uma ala do governo acredita que seja possível manter os cinco anos atuais, já que muitos ativos estão amortizados e os custos são baixos.
As empresas, no entanto, poderiam pedir revisões extraordinárias a qualquer momento se comprovarem que há um desequilíbrio nas contas. Há ainda a energia comprada de Itaipu, cotada em dólar e cujo contrato não pode ser alterado. Se houver uma flutuação muito grande do câmbio, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) teria de fazer uma revisão tarifária fora do prazo estipulado em contrato. Além disso, algumas usinas novas, como Belo Monte, tem contrato de venda de energia atrelado à inflação. Ou seja, a variação continuaria sendo repassada para a tarifa.
Na avaliação de integrantes do governo, o fim dos reajustes anuais vai garantir tarifas mais justas para a sociedade e, ao mesmo tempo, criar um ambiente propício para juros baixos. Hoje a conta de luz do brasileiro é uma das mais altas do mundo. "Passou da hora de tomar uma medida firme em relação às tarifas de energia. Tem sido um ciclo vicioso. A tarifa sobe porque a inflação está alta. E a inflação sobe porque a tarifa aumentou", disse uma fonte.
A expectativa é que a proposta de Projeto de Lei com as condições da prorrogação dos contratos seja apresentada no início do mês que vem. Isso porque, de acordo com as regras de concessão, as companhias terão até 7 de julho para manifestar o interesse de renovar ou não a concessão. A Aneel já informou que as simulações feitas até agora mostram redução entre 3% e 12% na conta de luz para o consumidor.
Depois do corte, a tarifa só seria alterada em revisões periódicas ou extraordinárias. Ao contrário de um reajuste, o processo de revisão faz uma análise mais profunda da empresa, levanta ganhos de produtividade, considera o volume de investimentos e prejuízos. Em alguns casos, em vez de subir, a tarifa cai.
Entre 2015 e 2017, terminam os contratos de 58 usinas geradoras, responsáveis por 20% da produção de energia elétrica do País. Também será o fim da linha para os contratos de 41 distribuidoras, que representam 30% do mercado, e de 73 mil quilômetros (km) de linhas de transmissão, equivalentes a 82% das concessões existentes.
A proposta de acabar com os reajustes anuais, no entanto, não deve contar com muitos defensores. Pelo contrário. Terá uma forte resistência. Para o presidente da Associação Brasileira das Empresas de Geração de Energia Elétrica (Abrage), Flávio Neiva, esse tipo de iniciativa não tem fundamento. "Nenhum preço está imune à inflação. Como ficam os salários, os encargos?", questiona o executivo.
Ele pondera que hoje as geradoras não têm tarifa, mas preços de energia definidos em leilão. Os valores são reajustados anualmente pela inflação. Para Neiva, nenhuma empresa vai querer fechar um contrato nessas condições com o governo.
O presidente da Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução de Energia Elétrica (Abiape), Mario Menel, não é tão radical. Para ele, tudo vai depender de uma grande negociação e de regras bem definidas. "Acho que pode ser uma proposta inteligente. O governo pode diluir a redução das tarifas dentro de uma período maior."
Para o professor Nivalde Castro, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, adotar essa medida será mais fácil para geradoras e transmissoras, que não tem uma estrutura de custo muito complexa. Já no caso das distribuidoras haverá a necessidade de resolver algumas questões específicas, como é o caso da Parcela A, de custos não gerenciáveis pelas empresas. Ele acredita que o modelo deve ser adotado também nos leilões de energia nova e de transmissão de eletricidade. (O Estado de S. Paulo)
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