Consequência da desarticulação das ações do governo, o descompasso entre a construção de usinas hidrelétricas e de linhas de transmissão da energia por elas geradas impedirá o País de se beneficiar integral e imediatamente de uma obra que está sendo concluída em tempo recorde.
Até o fim deste mês, estará em plena operação a primeira turbina, de 71,6 megawatts (MW), da Usina de Santo Antônio, no Rio Madeira (RO), que terá capacidade total de 3,15 mil MW. Mas tudo que ela gerar nos próximos meses será consumido na região, pois ainda não há como transmitir sua energia para os principais centros de consumo.
À época de sua licitação, há cerca de quatro anos, a Hidrelétrica de Santo Antônio foi considerada a principal alternativa para evitar uma crise de abastecimento de energia no País a partir de 2012. No que dependeu do consórcio responsável pela construção e, em breve, pela operação de Santo Antônio, essa expectativa poderia se concretizar, pois a primeira turbina está sendo colocada em operação cinco meses antes do prazo contratual. Novas turbinas entrarão em operação nos próximos meses.
Pelo menos até novembro do próximo ano, porém, não haverá como transmitir essa energia para os grandes centros consumidores, pois a linha de transmissão ligando Porto Velho à subestação de Araraquara, já no sistema nacional interligado, com cerca de 2,4 mil quilômetros de extensão, começou a ser construída há pouco tempo.
O cronograma previa a conclusão da linha em novembro passado, mas, com os atrasos acumulados até agora, sobretudo em razão da demora na concessão da licença ambiental, ela só estará pronta quase um ano depois de a usina ter iniciado suas operações. Então, Santo Antônio estará operando 15 turbinas, com capacidade de 1.074 MW, de acordo com as projeções da Aneel (concluída, a usina terá 44 turbinas).
Santo Antônio é uma das duas usinas em construção no Madeira. A outra é a de Jirau, que deverá iniciar suas operações em janeiro de 2013 com capacidade total de 3,45 mil MW. O atraso na construção das linhas de transmissão (serão duas, entre Porto Velho e Araraquara) imporá perdas para os controladores de ambas, pois eles não poderão beneficiar-se das vantagens de antecipar a produção, que lhes asseguraria o direito de vender a energia no mercado livre, a preço melhor do que o acertado nos leilões de concessão. Esse, infelizmente, é um problema generalizado no setor.
Balanço feito pela Aneel em meados deste ano indicava que 55% das linhas de transmissão em construção estavam atrasadas, e o atraso médio era de mais de dez meses. Em agosto, quando do anúncio do novo plano decenal para o setor, elaborado pela Empresa de Pesquisa Energética, dirigentes de empresas energéticas calculavam haver de 30 a 40 projetos de linhas de transmissão com obras atrasadas, com atraso médio de 22 meses, por conta da demora na concessão do licenciamento ambiental.
No caso do linhão que atenderá a Hidrelétrica de Santo Antônio, os funcionários do Ibama alegaram que a empresa responsável pelas obras atrasou a entrega da documentação necessária, mas que, uma vez entregues os documentos, a licença foi concedida com rapidez. A empresa, por sua vez, argumenta que o prazo previsto pelo governo para a concessão da licença era de 12 meses, mas 27 meses se passaram até que a questão ambiental fosse inteiramente resolvida.
Assinado em fevereiro de 2009, o contrato para o linhão de Santo Antônio previa a conclusão da obra em 36 meses, mas, até agora, só 22% foram executados. A empresa responsável informou ao Estado que, mesmo sem a licença, já havia contratado os insumos, materiais e equipamentos necessários, o que deve contribuir para acelerar os trabalhos daqui para a frente.
O caso mostra como é falho o planejamento do setor. O problema se repetirá com a Usina de Jirau e, se nada mudar, provavelmente também com a de Belo Monte, no Rio Xingu, que será a terceira maior do mundo. (O Estado de S. Paulo)
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