sexta-feira, 15 de julho de 2011

Com a faca no pescoço

Artigo:
A energia eólica é um bebê na política energética brasileira. Requer cuidados pedagógicos, metaforicamente falando, que entendam suas etapas evolutivas. Pois criança não é adulto em miniatura. Qualquer desrespeito ao frágil desenvolvimento nas eólicas põe muito a perder no que se está construindo. - O parto não foi fácil: há décadas, funcionavam apenas três modestos e experimentais aerogeradores da Cemig nas proximidades de Diamantina. Mencionam-se algumas experiências em Fernando de Noronha. Outras houve, sem expressão por aí, até mais antigas, e nada mais. 

A partir de 2001, o fórceps oficial veio com o Programa Nacional de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia (Proinfa), que definiu a contratação de 1,47 gigawatts (GW) dos ventos, com desacertos até na nomenclatura: o correto seriam energias renováveis de dimensão elevada frente às energias opcionais

Naquele quadro, no meio de gente séria, houve aventuras. Ainda há projetos eólicos incentivados do Proinfa por se colocar em marcha. Observe-se que o Proinfa falhou em várias camadas. E o governo vem dando repetidas oportunidades de normalização dessas singularidades, adiando sua aceitação.

Apenas para ilustrar: equivocado, o governo exigiu índices de nacionalização dos parques geradores inalcançáveis. O governo não concedeu aos investidores os benefícios dos sequestros de carbono do ar, reservados à Eletrobras que não os foi buscar. O governo também careceu de um arcabouço regulatório setorial, inexistente (por exemplo, um parque até então podia sombrear o vizinho, diminuindo sua eficiência). O governo ainda mostrou-se incapaz de deter aqueles que pretendiam sentar-se em cima dos projetos apenas para especular.

O pioneirismo esbarrou em especulações imobiliárias. Dois projetos obtinham arrendamento na mesma área e havia que correr para registrar em cartório os direitos de uso. Faltava mão de obra qualificada (problema não superado até hoje). A logística de montagem também permaneceu sofrível (entrar de jamanta nas dunas molhadas do Piauí, ou usar o Porto de Mucuripe na maré baixa).

Mas, o Proinfa foi remunerando os empreendedores com até R$ 240 por megawatt-hora (MWh), enquanto no próximo leilão de agosto esperam-se níveis de contratação ao redor de R$ 110,00 por MWh. 

Os players agora são Cenpes/ Petrobras, Cemig, CPFL, Iberdrola, EDP, Furnas, Eletrosul, Chesf e que tais. Purgaram-se as aleivosias e especulações. Nessa disputa de gente grande, esmagam-se os médios enquanto escapam as pulgas nos interstícios da arena.

Todavia, os investidores conviverão com espadas sobre a cabeça. Uma ou duas canetadas do Poder Executivo ou do Congresso Nacional e um tsunami se abateria sobre esses empreendimentos engendrados para muitos anos.

Veja de onde vem os preços relativos da energia eólica no Brasil:

1) De um encargo pago por todos os consumidores chamado de energia de reserva (que se soma ao pagamento do encargo do Proinfa);

2) Do enquadramento de eólicas no PAC (dispensa de impostos na obra);

3) Do enquadramento de eólicas no Reidi (empréstimos com carências e prazos dilatados, além de taxas de juros favorecidas);

4) Do direito do investidor de ir buscar seus créditos de carbono segundo o Protocolo de Kyoto (no Proinfa se perderam);

5) Do aumento do prazo de vida útil do projeto, de quinze para vinte anos;

6) Da atual possibilidade de o projeto poupar capital em conexão com o transporte de energia, pagando pedágio às Instalações Compartilhadas de Geração;

7) Da renúncia fiscal de alguns estados e municípios (notadamente ICMS);

8) Do amparo à bancabilidade, aos seguros e garantias, por meio de bancos (BNDES, BNB, Banrisul e outros), além de benesses de agências de desenvolvimento estaduais e regionais (Sudene, por exemplo);

9) Do benefício dado a projetos com menos de 50 MW de potência, ou a pequenas centrais de menos de 30 MW (com descontos de no mínimo 50% no transporte da energia ao consumidor especial);

10) Na flexibilidade dos organismos ambientais nas licenças prévias, de instalação e de operação das fazendas eólicas;

11) Apoio dos cinco esses (Sesc, Sesi) na qualificação da mão de obra; e,

12) Em breve, na provável definição da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) de um mecanismo de realocação de energia à semelhança dos hidrogeradores. Simplificando, os aerogeradores que receberem muito vento (além do esperado) ofertarão a energia no lugar daqueles sem ventos abundantes. E todos eles, no mínimo, receberão receitas pré-desenhadas.

Aqui não se esgota a lista para esclarecer que eólica é uma aposta de Nação, na qual se envolvem governos, agentes da sociedade e na qual todos se comprometem. Isso significa que não é uma energia competitiva, e sim incentivada. Cabe-nos dizer, os poderes republicanos podem retirar, a qualquer momento, o que concedem.

E a margem de resultados de uma eólica será mínima nesses leilões. Ai de quem sofrer quebra de componentes ou surpresas de mudanças climáticas, para não falar dos riscos regulatórios, de arbitragem, cambiais e fiscais. Observe-se também que o real desconhecimento (dos mapas dos ventos) ainda não incluo nessas incertezas.   Autor: Paulo Ludmer (DCI)

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