quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Conta de luz mais salgada

Para justificar os discursos da presidente Dilma Rousseff e do ministro da Fazenda, Guido Mantega, de que não haverá tarifaço de energia depois das eleições, o Ministério de Minas e Energia (MME) foi obrigado a informar o efeito dos empréstimos de R$ 17,7 bilhões às distribuidoras de eletricidade no reajuste das faturas. O MME divulgou que o impacto será de 9,86% até 2017. Contudo, especialistas apontam que o cálculo considera apenas uma parte do choque que o consumidor terá na conta de luz a partir do ano que vem. O índice realista, segundo eles, é de mais de 24%.

Em nota, o MME afirmou que o impacto dos empréstimos na tarifa cobrada do consumidor alcançará 2,6% em 2015, chegando a 5,6% em 2016 e a 1,4% em 2017, considerando o montante total que será repassado às distribuidoras para cobrir as despesas com o encarecimento do custo da energia. O primeiro crédito, de R$ 11,2 bilhões, feito por 10 bancos, já foi totalmente utilizado para pagar as operações de compra de eletricidade feitas até abril no mercado de curto prazo. Para quitar as contas de maio, cujo vencimento foi postergado duas vezes pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), e agora fixado em 28 de agosto, o Ministério da Fazenda negocia um novo financiamento, de R$ 6,5 bilhões, que deve ser anunciado hoje.

Na avaliação do gerente de Regulação da Safira Energia, Fábio Cuberos, o governo "esqueceu-se" de colocar na lista vários outros fatores que terão impacto significativo nas tarifas. "O cálculo do ministério se refere só aos empréstimos. Além disso, ele deduziu da conta os efeitos que espera obter com a renovação das concessões de usinas e distribuidoras, prevista para o ano que vem", explicou.

Reajustes - Quando editou a Medida Provisória 579, em 2012, o governo antecipou a renovação de várias concessões para permitir um desconto de 20% na tarifa do consumidor, numa medida considerada intervencionista e eleitoreira. A maior parte das adesões foi de empresas controladas pela União, mas três das maiores companhias, as estaduais Copel (PR), Cesp (SP) e Cemig (MG) não aceitaram a proposta e terão as licenças relicitadas. O governo acredita que, com as concessões em novas bases, o preço do megawatt/hora (MWh) ficará mais baixo a partir do ano que vem, já que, pelos contratos, as empresas serão remuneradas apenas pela geração de energia, e não mais pelo custo dos investimentos já amortizados.

Cuberos, porém, destacou que ainda é preciso agregar ao custo da energia as revisões tarifárias das concessionárias, os reajustes anuais que são indexados ao Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e o impacto do uso das usinas termelétricas desde 2013. "Esse despacho térmico era para começar a ser pago em 2014, mas foi adiado para 2015. É uma conta para ser paga em cinco anos, e não é barata. Também vai parar na tarifa", disse.

Outro fator que deverá aumentar o cálculo minimalista do governo é o efeito da entrada em vigor do sistema de bandeira tarifária. De acordo com o presidente da Associação Brasileira das Companhias de Energia Elétrica (ABCE), Alexei Vivan, o modelo já deveria ter sido adotado, mas o governo também adiou essa medida, que consiste em regular o custo da energia conforme as condições do mercado. Em períodos de menos chuvas e maior despacho térmico, a tarifa seria majorada, para ser reduzida em momentos de condições hidrológicas mais favoráveis. "Com a bandeira, o consumidor sabe que a energia está mais cara e pode reduzir voluntariamente o consumo para gastar menos", explicou Vivan.

Para Cuberos, da Safira Energia, o leilão emergencial que o governo fez este ano para tentar abastecer as distribuidoras, que tinham um deficit de 3 mil megawatts médios, também vai pesar na conta de luz. "No leilão, o preço médio negociado foi de R$ 270 o MWh", lembrou. O valor ficou abaixo dos R$ 822,83 que estavam sendo cobrados no mercado curto prazo, mas bem acima dos R$ 50 a R$ 80 que é possível pagar às hidrelétricas em períodos chuvosos. "As nossas estimativas são de, pelo menos, 24% de reajuste nas tarifas, mas o governo mascarou o índice, calculando apenas o impacto dos empréstimos às distribuidoras", ressaltou o especialista.

Custo maior - O MME já utilizou o novo financiamento de R$ 6,5 bilhões nos cálculos divulgados ontem. Fontes afirmaram que, desta vez, o número de bancos participantes será menor que na outra operação, e os juros, mais altos. O aporte inicial de R$ 11,2 bilhões teve taxa de 1,9% mais a variação dos Certificados de Depósito Interbancário (CDI). Do novo empréstimo, a maior parte, de R$ 3 bilhões, será desembolsada pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Caixa, Banco do Brasil, Bradesco, Itaú, Santander e BTG Pactual também devem participar. A primeira parcela deverá ser liberada em 15 de agosto.

Peso no bolso - Apenas empréstimos às distribuidoras vão elevar tarifa de energia elétrica em quase 10% até 2017.
Indicadores 2015 2016 2017
Parcelas dos empréstimos (Em R$ bilhões) 5,9 10,5 6,8
Ganho com a entrada de energia (Em R$ bilhões) 3,3 4,9 5,3
Reajuste (em %) 2,6 5,6 1,4