O crescimento da demanda por energia elétrica no Brasil, associado ao aumento do custo marginal da geração e às restrições ambientais à construção de novas usinas, impõe cada vez mais a necessidade de utilizar com eficiência as fontes de geração existentes. Uma forma racional de uso do parque gerador atual é a repotenciação de usinas hidrelétricas. Ela pode ser feita: 1) por meio da substituição de máquinas antigas (turbinas, geradores e rotores), algumas com mais de 30 anos, por novas; 2) pela instalação de máquinas adicionais em poços vazios de usinas existentes, em muitos casos previstos nos projetos originais; e 3) pela modernização de instalações e sistemas de controles de usinas, para melhorar seu desempenho e adicionar energia firme, reserva de potência e atender à ponta de forma mais barata e ambientalmente melhor.
Alguns estudos mostram a importância da repotenciação dessas usinas. Um deles, do WWF-Brasil, considerando 67 usinas no nosso parque hidrelétrico com porte superior a 30 MW e mais de 20 anos de operação, totalizando 34.735 MW, apontou um potencial de ganho de capacidade de 8.093 MW (ou 23,3% do total) apenas com a substituição do rotor do gerador elétrico. Em outro estudo, a Empresa de Pesquisa Energética estimou um aumento de energia firme de 270 MW médios, correspondentes a um acréscimo na potência efetiva do Sistema Interligado Nacional (SIN) de 605 MW - considerando o incremento no rendimento de um subconjunto de usinas hidrelétricas do SIN com mais de 20 anos de idade, totalizando 24.053 MW.
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), com base em dados da Abrage sobre poços disponíveis em usinas hidrelétricas existentes para instalar novas unidades geradoras, estimou um potencial de acréscimo de potência de 5.200 MW nessas usinas. Segundo a Aneel, a instalação da nova motorização permitiria turbinar entre 1.400 MW médios e 3.400 MW médios de energia, que é hoje vertida, dependendo do ano.
A repotenciação traz várias vantagens ao sistema elétrico. Considerando que a expansão das hidrelétricas tem sido limitada pela construção de reservatórios mínimos, para atender ao conceito de fio dágua, decorrente das exigências ambientais, a repotenciação das usinas é ainda mais adequada, pois seria feita em hidrelétricas existentes próximas aos centros de carga ou em regiões onde firmam a oferta de energia elétrica, com impacto ambiental mínimo.
O SIN necessita de potência adicional para garantir sua segurança operacional. A falta de potência poderá ser agravada pela maior participação das demais fontes renováveis e hidrelétricas a fio dágua. Hoje, essa potência adicional é muitas vezes assegurada pela geração em termoelétricas, que requer dos consumidores o pagamento do Encargo de Serviço do Sistema e gera maiores impactos ambientais. As outras fontes renováveis, apesar de estarem assumindo significativa participação na matriz de geração elétrica, precisam das hidrelétricas para assegurar o suprimento da carga, pelas características intrínsecas de intermitência e sazonalidade.
Mas o aproveitamento desse potencial requer mudanças no marco regulatório do sistema elétrico, com o intuito de incentivar os investimentos necessários à repotenciação. Uma questão que deve ser destacada é a necessidade de a Aneel definir uma solução regulatória que permita aos agentes a remuneração do investimento na repotenciação, e não só o ressarcimento dos seus custos.
O planejamento do governo (PDE 2020) não considera a necessidade de potência adicional, apesar de a nova estrutura da matriz de geração acentuar os problemas operacionais de potência para atender à carga e à ponta. A potência adicional garantirá ao SIN maior segurança operacional, além de vir ao encontro da exigência que vigerá a partir de 2014, quando será exigido de todos os agentes lastro de potência para garantir 100% de seus contratos. Nos países que já aproveitaram todo o seu potencial hidrelétrico, este processo é rotineiro. Aqui, no Brasil, está só começando. Artigo de Adriano Pires e Abel Holtz sobre o assunto. (O Estado de S. Paulo)
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