O Tesouro Nacional terá de fazer um aporte de R$ 8,46 bilhões este ano para garantir a queda de 18% nas contas de luz das famílias brasileiras e de até 32% na indústria, prometida pela presidente Dilma Rousseff. Para fechar essa conta, no entanto, o governo deverá recorrer mais uma vez a uma manobra fiscal, por meio de uma operação de triangulação com o BNDES. O Tesouro Nacional explicou que, do valor total do aporte, já estão garantidos R$ 4,1 bilhões de créditos anuais que a União recebe referentes à dívida da usina binacional de Itaipu com o governo brasileiro. Os outros R$ 4,36 bilhões poderão ser sacados dos fundos setoriais de energia elétrica ou antecipados dos créditos que o Tesouro tem junto à usina.
Esses fundos do setor de energia elétrica têm hoje R$ 27 bilhões, mas serão reduzidos a R$ 6 bilhões devido ao pagamento de indenizações às concessionárias que fecharam acordo com o governo para reduzir as taxas. Com isso, para bancar a redução das tarifas - em 2014, o total necessário para isso deverá continuar no patamar de R$ 8,4 bilhões - o governo deve antecipar créditos de Itaipu, por meio de uma operação com o BNDES de venda de recebíveis, em que o banco de fomento compra o crédito e antecipa a receita para os cofres públicos.
Economista critica contabilidade criativa
Essa possibilidade já estava prevista na medida provisória MP) 600, publicada no fim de 2012 para garantir a queda na conta de luz. Operações semelhantes foram feitas pelo governo na capitalização de Eletrobras e Petrobras. Para o economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Mansueto Almeida, mesmo legais, elas são uma forma de contabilidade criativa para ampliar artificialmente as receitas do governo. De um lado, o governo faz aportes bilionários no BNDES, sem impacto na despesa primária, e, de outro, usa o órgão para antecipar receitas. Dessa forma, o governo aumenta o gasto sem reduzir o superávit primário (economia para o pagamento de juros da dívida). O mais transparente seria não colocar o BNDES nessa operação, e sim reduzir o superávit - disse.
Mais cedo, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, explicou que o governo refez as contas e aumentou dos R$ 3,3 bilhões estimados em setembro para R$ 8,46 bilhões o desembolso necessário para bancar o plano, porque as concessionárias Cesp (SP), Cemig (MG) e Copel (PR) se recusaram a renovar os contratos com redução de cerca de 70% na receita. Mas ele garantiu que a alteração não afetará os programas sociais do governo, embora a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) tenha sido criada para financiar a universalização do serviço de energia e a tarifa social.
- Nenhum programa social será interrompido. Todos prosseguirão, e todos obterão também descontos - disse o ministro.
Perguntado se os créditos de Itaipu, utilizados agora para compensar o corte na tarifa de energia, não farão falta no futuro, Lobão respondeu que essa é "uma questão interna do Tesouro". Como foi construída por Brasil e Paraguai, mas bancada com recursos do governo brasileiro, a União tem a receber entre US$ 14 bilhões e US$ 15 bilhões referentes a contratos com vigência até 2023.
No mês que vem, efeito ainda parcial
Embora tenha começado a valer ontem, os consumidores só sentirão o alívio no bolso a partir do fim de fevereiro, pois as distribuidoras fazem a leitura dos relógios em datas diferentes. Segundo o diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Nelson Hubner, para grande parte dos brasileiros, o efeito da medida na conta do mês que vem ainda será parcial:
- No caso das (casas em) que a leitura é feita dia 10 de fevereiro, vai ter efeito médio. A partir de 25 de fevereiro, todos têm impacto total da tarifa.
O governo aposta que, com a redução na conta de luz, os brasileiros tenham uma renda extra para consumir mais. Como o GLOBO mostrou ontem, a decisão da presidente Dilma Rousseff foi amparada em um estudo segundo o qual uma diminuição de R$ 1 nas tarifas de energia resultará em aumento de R$ 6 a R$ 8 no PIB ao longo do ano, por causa do aquecimento na economia.
FIESP ESTIMA ECONOMIA DE R$ 31,5 BILHÕES
A Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) considerou um passo importante a redução das tarifas de energia anunciada pela presidente Dilma Rousseff e estima que, com a medida, os consumidores residenciais e as empresas gastarão menos R$ 31,5 bilhões ao ano com energia elétrica, dos quais R$ 9,98 bilhões são da indústria. “Toda a sociedade ganha com isso. Reduzindo as contas de luz, os custos de produção serão reduzidos também, e bilhões de reais vão movimentar a economia. A medida beneficia todos os setores da sociedade, e atinge diretamente o bolso de cada brasileiro”, disse o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, em nota. “Ganhamos a guerra contra aqueles que desejavam manter uma das contas de luz mais caras do mundo. Assim, não era possível crescer”, afirmou Skaf. “Esta é uma vitória de todos nós, brasileiros.” Já o diretor da federação Carlos Cavalcanti estimou que, com custos menores, os industriais vão repassar o desconto aos preços dos produtos. Mas, não se arriscou a prever quando os descontos chegarão aos consumidores. Para o economista Rogério César de Souza, do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), não é possível garantir o repasse do desconto aos preços: — Esperamos que a medida bata no preço, mas não dá para garantir. (O Globo)
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