Artigo:
O setor elétrico enfrenta situação extremamente delicada, prestes a vivenciar momento inédito na história jurídica brasileira: o término das concessões (20% da geração somado a 73 mil quilômetros de linhas de transmissão). Somadas a falha legislativa e a inexperiência da Administração Pública no assunto, a reversão pura e simples das concessões, como imaginada na origem – no início da década de 90 – não parece factível.
Duas razões saltam aos olhos: a primeira, relacionada à operação dos sistemas, indica que se todas as usinas e linhas de transmissão forem revertidas ao Estado, viveremos o blackout, mesmo que de novo o concessionário assuma os serviços (após regular licitação), tendo em vista as dificuldades desta substituição. A segunda razão, mais difundida, é econômica e se materializa no alto valor estimado à indenização aos concessionários atuais, por investimentos não amortizados (estimados em R$ 47 bilhões).
Este problema já está posto à decisão do governo há muito tempo. Mesmo assim, interessante notar que situações semelhantes já foram vivenciadas pela Administração Pública, mas nem sempre tratadas com o devido cuidado – o que poderia ter reduzido o problema ora enfrentado.
Muitas concessões energéticas têm origem anterior à lei de concessões de serviço público e, por isso, expiraram ao menos uma vez. O que fez o governo? Na maioria dos casos, via Ministério de Minas e Energia, prorrogou os contratos (conforme permite a legislação), sem a devida análise.
Nesse meio, destaca-se a atuação da Aneel, que produziu rico e relevante material, cujo conteúdo deveria ser analisado pelos demais tomadores de decisão, seja naqueles casos ou nos futuros, para que o setor caminhe de forma organizada, com passos firmes.
Apesar de distintos os institutos, os argumentos e os focos de uma análise acurada sobre a renovação e a prorrogação das concessões são muito similares. Nesse contexto, realizamos pesquisa extensa, sobre todos os casos analisados pela Aneel sobre prorrogação de concessões de geração hidrelétrica, entre os anos de 2004 a 2011.
Dezenove casos foram analisados, englobando 53 geradoras de energia hidrelétrica, sendo: 15 Pequenas Centrais Hidrelétricas, 36 Usinas Hidrelétricas e duas Centrais Geradoras Hidrelétricas. Deste conjunto, também notamos que a exploração dos empreendimentos se dava principalmente pelo regime de serviço público, seguido pelos produtores independentes e, então, pelos autoprodutores.
Assim, pôde-se traçar algumas linhas gerais no perfil da Aneel. O quadro desenhado não é autoaplicável às renovações possivelmente vindouras, mas muito do que discutido deveria ao menos ser refletido para melhorar a gestão das concessões.
Verificamos que o entendimento é favorável à prorrogação das concessões e tende-se a recomendá-la pelo prazo máximo permitido. Destacando-se, como principal fundamento, o saldo de investimento não ressarcido ao concessionário.
Nota-se, porém, um período (entre 2004 e 2006) com deliberações manifestamente formalistas da Agência, presas a dispositivos normativos, para a simples instrução do processo. A tendência começou a ser superada em 2006, na análise do caso da Cemig, quando a Aneel deixou o formalismo e buscou a substância: analisou fatores econômicos, contábeis e inclusive de operação.
Cabe destaque à ex-diretora Joísa Campanher Dutra Saraiva, que proferiu votos bastante técnicos. Apresentou, ainda, estudos separados e trabalhos específicos sobre o tema, analisando a fundo as questões. A Diretora trouxe elementos para a discussão da reformulação da base legal e regulatória sobre o assunto. E neste escopo, a Aneel buscou firmar tais critérios com precedentes, o que não foi acolhido pela Procuradoria-Geral da Agência e pelo MME.
Tentou-se, por exemplo, viabilizar a assunção, pela Aneel, da competência decisão definitiva na prorrogação das concessões com capacidade instalada até 30.000 kW. Em que pese o benefício da celeridade, tal divisão poderia culminar em distintos critérios de prorrogação, um técnico e outro claramente político, no Ministério.
Em 2010, as decisões tornaram ao primeiro período verificado. Ou seja, retomou-se a formalidade nas deliberações que, no entanto, passaram a expressar recomendação da Aneel, o que não se via no primeiro momento.
Apesar do movimento cíclico, na maioria dos casos (14), decidiu-se de maneira unânime pela recomendação favorável à prorrogação. Resta saber se a posição atual será mantida para as renovações em discussão.
Considerando o perfil traçado, é possível afirmar que as concessões vincendas possuem lastro para argumentação, caso haja possibilidade de prorrogação. Percebe-se, também, que a discussão em torno dos vencimentos do ano de 2015 está na viabilidade de suas renovações, que restam pressionadas pelos estimados montantes de indenização, a modicidade tarifária e o dever de continuidade dos serviços públicos. A resposta virá do governo e poderá alterar as regras do jogo. Autora: Rosane Menezes Lohbauer é sócia da área de infraestrutura e regulatório do Madrona Hong Mazzuco Brandão – Sociedade de Advogados. Rodrigo Barata é advogado do mesmo escritório. (EnergiaHoje)
Leia também:
* Mesmo acumulado reajuste será mais leve
* Fontes diversas e um linhão
* Utilização de energia solar pode ter incentivo fiscal
* Um modelo para dar certo na Amazônia
Leia também:
* Mesmo acumulado reajuste será mais leve
* Fontes diversas e um linhão
* Utilização de energia solar pode ter incentivo fiscal
* Um modelo para dar certo na Amazônia