O intercâmbio de conhecimento entre CCEE e instituições internacionais de energia já se tornou prática frequente, e a cada interação temos a oportunidade de comparar mercados, refletindo sobre as particularidades de cada sistema e também sobre as oportunidades de aprimoramento do setor elétrico brasileiro. Uma das principais premissas neste exercício de pensar diferenças e semelhanças é conscientizar-se de que não há a chamada “receita de bolo”, a qual se pode simplesmente copiar e aplicar no mercado brasileiro sem causar, no mínimo, um resultado indigesto.
Em junho tivemos nova oportunidade de intercâmbio com representantes de mercados europeus de energia elétrica, em participação no evento “Energy Trading 2010”, realizado na Polônia. Em linhas gerais, o continente enfrenta nos últimos tempos o desafio de consolidar sua integração, unificar as regras de mercado e a operação. Tendo em vista a heterogeneidade do público leitor em relação ao tema, permito-me resumir a seguir as principais linhas do mercado europeu.
Em contraste ao Brasil, comumente é destacado um certo dinamismo comercial na Europa, relacionado à liquidez de contratos e à coexistência de vários ambientes de negociação - contratos bilaterais (“over the counter” ou OTC), plataformas eletrônicas e as próprias bolsas. Os mercados europeus variam quanto ao despacho e à formação de preços, mas, em geral, o que vemos é a realização do leilão d-1 (“day ahead market”), no qual produtores e compradores informam ao operador suas lances (preço/volume) no dia anterior ao despacho, neste caso, comercial.
Em seguida ao leilão d-1, inicia-se o leilão “intraday” para o ajuste das posições do dia em curso – seja para produção adicional ou redução da demanda. O “intraday” encerra-se, em vários países, uma hora antes da efetiva produção/ consumo. Naqueles mercados, os consumidores são sensíveis aos preços da energia (“demand side bidding”), têm a possibilidade de venda das sobras de contrato e não precisam estar 100% contratados, permitindo que os agentes (compradores e vendedores) fiquem expostos ao preço spot.
Já o Brasil vive a consolidação de seu modelo setorial, fundamentado na modicidade tarifária, segurança no abastecimento e inclusão social. Há um sistema interligado amplo com despacho físico centralizado e predominância de geração hidrelétrica, com muitas usinas de diferentes proprietários em um mesmo rio.
Nosso modelo antecipa o mercado em três a cinco anos ao promover os leilões de compra de energia para o mercado cativo, o qual utiliza a figura do comprador centralizado para firmar contratos de longo prazo. Os montantes contratados são rateados na proporção das quantidades demandadas pelas distribuidoras, de modo a cobrir 100% do consumo estimado. Viabiliza-se, assim, a expansão da oferta, tendo como resultado dos certames contratos de 15 e 30 anos no ambiente de contratação regulada.
Os leilões de compra adotados no Brasil são um dos principais temas de interesse dos estrangeiros. Esta sistemática mostrou-se, de fato, bastante apropriada a economias como a do Brasil, que apresenta altas taxas de crescimento. Em 2006, o consumo os países da União Europeia aumentou 2,0% em comparação ao ano anterior. No Brasil, esta taxa foi de 3,9%.
Já no mercado de curto prazo há o processo de contabilização e liquidação financeira multilateral realizado mensalmente pela CCEE, no qual as diferenças contratuais (produção versus consumo) são valoradas ao chamado PLD, Preço de Liquidação das Diferenças, calculado semanalmente pela CCEE. Como o próprio nome revela, o PLD foi concebido para precificar as diferenças e teria importância relativamente pequena em um cenário que exige a contratação de 100% da demanda. No entanto, o mercado livre apoiou-se no PLD para referenciar suas negociações.
Estuda-se atualmente diversas alternativas para tornar o PLD mais aderente à realidade do mercado, considerando também a resposta da demanda. Dois grupos de trabalho ligados à Comissão Permanente para Análise de Metodologias e Programas Computacionais do Setor Elétrico (CPAMP) estão dedicados os aperfeiçoamentos nas frentes. “Metodologia de formação do Custo Marginal de Operação (CMO) e do PLD e Impactos nos Encargos de Serviço do Sistema (ESS)”, coordenado pela CCEE, e também “Volatilidade do CMO”, coordenado pelo ONS. A CPAMP é coordenada pelo Ministério de Minas e Energia (MME).
O Brasil está aperfeiçoando seu ambiente de negociação, com a cessão de excedentes de energia pelos consumidores livres, por exemplo, e caminha para o mercado varejista de energia elétrica. O quê e o quanto aplicar dos mecanismos europeus no mercado brasileiro é tema a ser analisado de forma criteriosa, observando-se as particularidades do nosso sistema, mas é certo afirmar que há enormes ganhos com este intercâmbio de conhecimento. Importante ressaltar que possíveis mudanças seguirão a prática de ampla discussão com as esferas representativas do setor elétrico e sua implementação exige a preservação da segurança comercial e dos alicerces do atual modelo setorial nacional.
*Antônio Carlos Fraga Machado - Presidente do Conselho de Administração da CCEE. (Fonte: CCEE News)
Em junho tivemos nova oportunidade de intercâmbio com representantes de mercados europeus de energia elétrica, em participação no evento “Energy Trading 2010”, realizado na Polônia. Em linhas gerais, o continente enfrenta nos últimos tempos o desafio de consolidar sua integração, unificar as regras de mercado e a operação. Tendo em vista a heterogeneidade do público leitor em relação ao tema, permito-me resumir a seguir as principais linhas do mercado europeu.
Em contraste ao Brasil, comumente é destacado um certo dinamismo comercial na Europa, relacionado à liquidez de contratos e à coexistência de vários ambientes de negociação - contratos bilaterais (“over the counter” ou OTC), plataformas eletrônicas e as próprias bolsas. Os mercados europeus variam quanto ao despacho e à formação de preços, mas, em geral, o que vemos é a realização do leilão d-1 (“day ahead market”), no qual produtores e compradores informam ao operador suas lances (preço/volume) no dia anterior ao despacho, neste caso, comercial.
Em seguida ao leilão d-1, inicia-se o leilão “intraday” para o ajuste das posições do dia em curso – seja para produção adicional ou redução da demanda. O “intraday” encerra-se, em vários países, uma hora antes da efetiva produção/ consumo. Naqueles mercados, os consumidores são sensíveis aos preços da energia (“demand side bidding”), têm a possibilidade de venda das sobras de contrato e não precisam estar 100% contratados, permitindo que os agentes (compradores e vendedores) fiquem expostos ao preço spot.
Já o Brasil vive a consolidação de seu modelo setorial, fundamentado na modicidade tarifária, segurança no abastecimento e inclusão social. Há um sistema interligado amplo com despacho físico centralizado e predominância de geração hidrelétrica, com muitas usinas de diferentes proprietários em um mesmo rio.
Nosso modelo antecipa o mercado em três a cinco anos ao promover os leilões de compra de energia para o mercado cativo, o qual utiliza a figura do comprador centralizado para firmar contratos de longo prazo. Os montantes contratados são rateados na proporção das quantidades demandadas pelas distribuidoras, de modo a cobrir 100% do consumo estimado. Viabiliza-se, assim, a expansão da oferta, tendo como resultado dos certames contratos de 15 e 30 anos no ambiente de contratação regulada.
Os leilões de compra adotados no Brasil são um dos principais temas de interesse dos estrangeiros. Esta sistemática mostrou-se, de fato, bastante apropriada a economias como a do Brasil, que apresenta altas taxas de crescimento. Em 2006, o consumo os países da União Europeia aumentou 2,0% em comparação ao ano anterior. No Brasil, esta taxa foi de 3,9%.
Já no mercado de curto prazo há o processo de contabilização e liquidação financeira multilateral realizado mensalmente pela CCEE, no qual as diferenças contratuais (produção versus consumo) são valoradas ao chamado PLD, Preço de Liquidação das Diferenças, calculado semanalmente pela CCEE. Como o próprio nome revela, o PLD foi concebido para precificar as diferenças e teria importância relativamente pequena em um cenário que exige a contratação de 100% da demanda. No entanto, o mercado livre apoiou-se no PLD para referenciar suas negociações.
Estuda-se atualmente diversas alternativas para tornar o PLD mais aderente à realidade do mercado, considerando também a resposta da demanda. Dois grupos de trabalho ligados à Comissão Permanente para Análise de Metodologias e Programas Computacionais do Setor Elétrico (CPAMP) estão dedicados os aperfeiçoamentos nas frentes. “Metodologia de formação do Custo Marginal de Operação (CMO) e do PLD e Impactos nos Encargos de Serviço do Sistema (ESS)”, coordenado pela CCEE, e também “Volatilidade do CMO”, coordenado pelo ONS. A CPAMP é coordenada pelo Ministério de Minas e Energia (MME).
O Brasil está aperfeiçoando seu ambiente de negociação, com a cessão de excedentes de energia pelos consumidores livres, por exemplo, e caminha para o mercado varejista de energia elétrica. O quê e o quanto aplicar dos mecanismos europeus no mercado brasileiro é tema a ser analisado de forma criteriosa, observando-se as particularidades do nosso sistema, mas é certo afirmar que há enormes ganhos com este intercâmbio de conhecimento. Importante ressaltar que possíveis mudanças seguirão a prática de ampla discussão com as esferas representativas do setor elétrico e sua implementação exige a preservação da segurança comercial e dos alicerces do atual modelo setorial nacional.
*Antônio Carlos Fraga Machado - Presidente do Conselho de Administração da CCEE. (Fonte: CCEE News)