quarta-feira, 25 de abril de 2012

Energia eólica: Expansão em risco

A expansão da energia eólica no Brasil está ameaçada. Problemas de conexão, logística, ambientais e de financiamento farão com que parte das usinas já contratadas tenha sérios atrasos ou mesmo deixe de entrar em operação neste e nos próximos anos.


Em 2012, a demora na entrega das estações coletoras de energia (ICGs) vai atrasar em até 13 meses a operação de 33 parques. Com isso, será adiado o início da geração de 811 MW negociados no primeiro leilão de eólicas, em 2009, e que deveriam começar a operar em junho. As usinas leiloadas em 2010 também tiveram sua operação postergada em seis meses, de janeiro para setembro de 2013.

Os parques negociados no leilão A-3 e de Reserva em 2011 vão pelo mesmo caminho, segundo o diretor-geral do ONS, Hermes Chipp. Ele tem advertido desde o ano passado que há risco de novo descasamento entre geração e conexão. Mesmo com o leilão de transmissão sendo realizado em março, e os contratos sendo assinados em julho, restariam 20 meses e 24 meses para a instalação. “O tempo médio de licenciamento (da linha de transmissão) é de 17 meses. Dificilmente esses prazos serão atingidos”, afirma Chipp.

Antes de se preocupar com a conexão, no entanto, os empreendedores eólicos precisam superar outros problemas, como o financiamento. Usinas contratadas no primeiro leilão de eólicas foram prejudicadas pelo corte abrupto do financiamento do Banco do Nordeste do Brasil (BNB) em 2011. O cancelamento dos empréstimos no fim do processo de habilitação teria prejudicado o cronograma e deixado em descoberto cerca de 300 MW, segundo fontes do mercado.

A CEA é outra pedra no sapato do setor. A distribuidora do Amapá, que não tem concessão nem cadastro na CCEE, comprou 26% da energia vendida no leilão de fontes alternativas de 2010, mas não pôde assinar os contratos. Isso impediu a liberação do financiamento do BNDES para a construção das usinas que venderam energia naquela licitação. E a maior parte da energia contratada é eólica, somando cerca de 300 MW.

O setor espera que a Aneel adote a mesma solução do A-5 de 2011, com a exclusão da CEA do leilão e a redistribuição da energia entre as concessionárias. O problema é que essa saída só foi possível porque a distribuidora havia contratado apenas 10,3 MW médios – 1,2% do total negociado.

Outra opção seria usar a energia desses parques para compensar a eletricidade que não será entregue pelas termelétricas da Bertin e da Multiner. A proposta, feita pela Abeeólica, está sendo estudada pela agência.

Pedra ambiental - A lentidão e a falta de critérios claros para obtenção de licenças ambientais são problemas antigos que têm atrapalhado a execução das obras, especialmente na região Nordeste, onde há uma grande concentração de projetos eólicos. Os principais gargalos são a falta de estrutura dos órgãos ambientais estaduais para analisar os processo e as diferentes exigências e regras em cada estado.

“Está havendo até problema arqueológico”, afirma Élbia Melo, presidente da Abeeólica. Segundo ela, estão sendo encontradas peças arqueológicas em algumas usinas, o que dá início a um longo e complicado processo de escavação e identificação dos achados por parte de instituições da área, atrasando as obras.

Entretanto, a executiva está confiante em que o problema da falta de padronização seja resolvido em breve, quando for concluído estudo de um grupo de trabalho no Ministério do Meio Ambiente (MMA) para harmonizar os procedimentos de licenciamento federal e dos estados. “Acho que até o fim do ano esse problema estará resolvido”, diz.

Os empreendedores também se preocupam com a falta de infraestrutura logística, um gargalo cada vez maior, à medida que o volume de obras aumenta – para se ter ideia, este ano será instalado o triplo da capacidade construída no ano passado. O problema é agravado ainda pela interiorização das usinas, que estão indo para municípios cada vez mais distantes de portos e sem estradas de acesso capazes de suportar o tráfego de carretas.

Uma das principais reclamações dos empreendedores é a falta de escolta para o transporte de grandes cargas. Serão necessárias mais de 5 mil viagens apenas este ano e não há pessoal suficiente nos órgãos estaduais para fazer o acompanhamento. O governo da Bahia resolveu o problema autorizando a contratação de escoltas particulares pelos empreendedores, solução que o setor espera que seja adotada por outros estados com o mesmo problema.

6.500 MW até 2014 - Mesmo com os obstáculos, Élbia acredita que os 7 GW contratados até 2014 serão entregues. “Algumas usinas vão atrasar, mas elas vão chegar, de uma maneira ou de outra” afirma ela.
Esse otimismo, porém, não é partilhado por todos no setor eólico. As estimativas mais conservadoras apontam para a instalação efetiva de 5 GW.

Mas o cenário não parece tão negativo. O mais provável é que o resultado fique num meio-termo, como prevê o presidente da Suzlon no Brasil, Arthur Lavieri. “Alguns parques vão atrasar, outros não vão ser entregues. Minha expectativa é que se chegue a 6.500 MW em 2014”, prevê.

Órfãos do BNB - Mais de 300 MW de energia eólica que deveriam ser entregues este ano ainda estão sem financiamento. Os projetos negociados no leilão de 2009 foram afetados pelo corte abrupto dos empréstimos a projetos eólicos pelo Banco do Nordeste do Brasil (BNB). Em meados do ano passado, a instituição mudou sua política de investimento, cancelando financiamentos a eólicas com as quais já havia se comprometido e que estavam em fase final de aprovação.

Os empreendedores afirmam que perderam um ano no processo com o BNB e, depois, tiveram de recomeçar do zero, entrando no fim da fila do BNDES. Além disso, dizem que o BNB foi um dos principais incentivadores da entrada das empresas no leilão, oferecendo juros mais baixos que o do BNDES, participação mais alta no total investido e financiando equipamentos importados.

Um empresário que não quis se identificar afirma que o banco atuou como advisor durante os leilões, assessorando sua companhia no momento dos lances e, inclusive, recebendo pagamento pelo desempenho atingido. De acordo com ele, a participação ativa do BNB foi determinante para que fechasse os contratos, e as condições oferecidas foram essenciais para a determinação dos preços nas concorrências.

A decisão de extinguir o financiamento do BNB para energia eólica foi tomada pelo governo federal, que determinou que o banco voltasse seus recursos para o microcrédito. Na ocasião, segundo fontes do setor, a diretoria do banco enviou uma lista dos empreendimentos com os quais já havia se comprometido, com 50 usinas, somando 1.156 MW.

As últimas eólicas a receberem recursos do BNB foram o complexo de Mangue Seco (104 MW), em Guamaré, da Petrobras, e três usinas da Desenvix na Bahia, com 90 MW. O restante teve de recorrer ao BNDES, com condições e procedimentos diferentes. Parte foi bem-sucedida e parte ainda aguarda a liberação dos recursos, usando capital próprio ou empréstimos-ponte para concluir as obras ou esperando a resposta do banco.

Alguns empreendedores conseguiram o adiamento do prazo de entrada em operação, mas outros temem que seus projetos sejam inviabilizados se não conseguirem o financiamento a tempo. (Revista Brasil Energia)