terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Uma nova ameaça ao setor elétrico

Após uma controvertida audiência pública, a agência reguladora do setor elétrico (Aneel) tenta consertar o curto-circuito provocado pelas sucessivas intervenções do governo no setor, agravadas pela seca, fixando o preço máximo da energia no mercado livre (Preço de Liquidação das Diferenças – PLD) em R$ 388,48 o MWh, menos da metade do valor vigente, de R$ 822,83/MWh. O preço mínimo do MWh passará de R$ 15,62 para R$ 30,26.

A fórmula de cálculo do PLD é discutida há anos. Prevalece o conceito de que o preço deveria ser fixado com base na oferta e na procura. Mas, sem que o fornecimento contratado de energia alcance o volume suficiente para atender à demanda, as distribuidoras tiveram de recorrer ao mercado de curto prazo, chegando a pagar mais de R$ 800 por MWh. Arcaram com custos enormes, que foram financiados por aportes do Tesouro e empréstimos bancários, onerando as contas públicas e os consumidores.

O rebaixamento do PLD provocou novas distorções. Em tese, as distribuidoras reduzem custos e as geradoras com energia para vender têm queda de receitas.

Ao mudar o modelo elétrico, o governo criou uma bomba-relógio: o Tesouro terá de aportar R$ 10,5 bilhões às distribuidoras, em 2014, o que não basta. As empresas terão de tomar créditos de R$ 17,8 bilhões. A tentativa oficial é evitar gastos adicionais em 2015. Mas, para cobrir as despesas já incorridas pelas distribuidoras com empréstimos, serão necessárias novas rodadas de alta de tarifas, pressionando a inflação.

O cálculo do novo PLD é questionado. O parâmetro é o preço cobrado pela energia gerada pela usina térmica Mário Lago, em Macaé (RJ), gerida pela Petrobrás. Mas a estatal notou que esse preço está “represado”. Até agora, o PLD baseou-se no preço da térmica de Alegrete (RS). A Aneel diz que o preço médio de aquisição de energia pelas distribuidoras foi de R$ 150/MWh, em 2014.

Não há clareza sobre os números, para permitir que os cálculos sejam aferidos. O uso de uma taxa mediana, no longo prazo, pode encobrir grandes oscilações, normais em tempos de estiagem.

Se o novo teto do PLD for irrealista – e aplicável a contratos em vigor -, a mudança abrupta de regras pode levar as geradoras à Justiça. Haja ou não o “risco de judicialização”, o governo não parece resistir à tentação de administrar preços, pondo sempre sob suspeita o livre jogo das forças de mercado. (O Estado de S. Paulo)
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