É justo que o governo procure aproveitar o vencimento da concessão de várias usinas hidrelétricas para tentar reduzir as tarifas de eletricidade no ato da renovação. No entanto, não se pode ir do 8 ao 80 nessa tentativa.
Houve um intenso debate no setor sobre a conveniência de se renovar ou não essas concessões. Algumas entidades empresariais, como a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), por exemplo, defenderam arduamente que as usinas fossem oferecidas em leilão, na expectativa que, ao assumi-las, novos concessionários passariam a oferecer tarifas mais baixas pela energia gerada. Acabou prevalecendo a posição de que a renovação das concessões seria melhor para o setor de energia elétrica, pois, no caso de leilão, potenciais investidores usariam nessa transação recursos que poderiam ser destinados à construção de novas hidrelétricas, o que, a médio e longo prazos, é fundamental para ampliação da oferta de energia e manutenção de tarifas adequadas para a economia.
No entanto, a renovação pura e simples seria um privilégio para os atuais concessionários, considerando-se que parte considerável dessas usinas já foi amortizada. Assim, para a renovação das concessões o governo pretende cobrar um "pedágio" das concessionárias, obrigando-as a aceitar tarifas bem mais baixas. E, no caso da parcela não amortizada das usinas, o governo arbitrou o valor das indenizações que as empresas deverão receber, como compensação.
Refeitas as contas, todos esses valores têm se mostrado inviáveis para o setor elétrico. A intenção de ampliar os investimentos na construção de novas hidrelétricas será parcialmente anulada pela perda de capacidade financeira dos concessionários, pois, de acordo com as regras estabelecidas pelo governo, as futuras tarifas sequer cobrirão os custos de manutenção de usinas em tese já amortizadas. Diante dessa possibilidade, concessionárias (mesmo sendo estatais, em sua maioria) ameaçam devolver usinas ou recorrer à Justiça.
Não existe razão para esse tipo de impasse, pois é possível conciliar a intenção de redução de tarifas com uma remuneração adequada para as concessionárias. Existe espaço para uma considerável redução de custos no setor, e é muito bom que a Eletrobras se sinta agora forçada a transferir para grupos privados a administração de companhias distribuidoras estaduais que foram "federalizadas" e continuam a amargar prejuízos crônicos.
Embora as autoridades afirmem que a proposta inicial do governo esteja embasada em estudos técnicos de alto nível, a contestação vem sendo feita também por profundos conhecedores do setor. Há que se considerar os argumentos de um e de outro lado para se reavaliar a proposta governamental, de modo a se encontrar uma solução que não seja nem 8 e nem 80. É perigoso qualquer viés ideológico contra o lucro. Pois é ele que move os investimentos. (O Globo)
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