A proposta do governo para renovação das concessões de geração e transmissão de energia embute uma perda de R$ 47,6 bilhões para as empresas do setor que aceitarem as condições. Esse valor inclui apenas as perdas de receita e indenizações às quais as geradoras e transmissoras teriam direito de receber até o vencimento das concessões, entre 2015 e 2017. Os valores fazem parte de um estudo de um banco de investimentos consultado pelo Valor e se referem a 109 usinas que querem renovar suas concessões. Dessas, o governo entende que apenas 15 usinas têm direito a indenização por ativos ainda não depreciados, ou seja, 94 usinas não têm direito a nada. Já o governo está propondo apenas o pagamento de R$ 20 bilhões.
"Se as empresas não aceitarem a proposta, vão receber R$ 47,6 bilhões ao final da concessão, ainda tendo direito a esses R$ 20 bilhões que estão sendo oferecidos antecipadamente", explica uma fonte, para quem a única empresa que vai aceitar é a Eletrobras.
Da perda total estimada pelo estudo, a maior parte, ou R$ 32 bilhões (praticamente o custo de Belo Monte) se refere à renúncia de receitas garantidas até o fim dos contratos. Outros R$ 15,5 bilhões são perdas relacionadas a investimentos em manutenção das geradoras de energia e a ativos de transmissão que entraram em operação antes de maio de 2000, para os quais a Medida Provisória 579 não prevê indenização.
Mas os contratos que estão perto do vencimento estabelecem o pagamento, ao fim da concessão, de uma indenização por investimentos não amortizados. Cálculos do governo e das empresas conflitantes, junto com a brutal redução de tarifas proposta para a renovação, estão na base da discórdia que pode levar a uma batalha jurídica.
Somente no Sistema Eletrobras o impacto é de R$ 29,3 bilhões, segundo o estudo. O valor equivale a 37% do patrimônio líquido da Eletrobras, ou a quase duas vezes seu valor de mercado, que era de R$ 15,36 bilhões.
Ao que parece a estatal vai precisar de um aporte de R$ 10 bilhões em um ano e meio se aceitar a proposta da renovação e quiser manter os investimentos.
Os bastidores do setor se agitam. Três diretores da Aneel - Julião Coelho, André Pepitone e Edvaldo Santana - não tiveram qualquer envolvimento com as notas técnicas de números 383 e 396 - elaboradas pela Superintendência de Regulação Econômica da Aneel. Elas foram encaminhadas diretamente para o Ministério de Minas e Energia (MME), sem passar pela aprovação da diretoria colegiada da autarquia.
Apenas o diretor-geral da agência, Nelson Hubner, e o diretor Romeu Rufino tiveram acesso aos estudos. Nos últimos anos, não se tem registro de nenhum documento oficial que tenha saído da agência sem o aval dos diretores. Segundo uma fonte a par do processo, se uma nota técnica da agência não teve o aval dos diretores, os valores apresentados por ela não tem consistência legal. "Esse documento é muito frágil do ponto de vista legal", diz.
Na Eletrobras, o clima é muito tenso. José Luiz Alquéres se desligou do conselho de administração da empresa na segunda-feira e o presidente da estatal, José da Costa Carvalho Neto, está sendo aconselhado por amigos a deixar o cargo. Enquanto isso, a Associação de Investidores no Mercado de Capitais (Amec) enviou carta para secretário-executivo do MME, Márcio Zimmermann, que também preside o conselho de administração da Eletrobras, e conselheiros lembrando que pela Lei das S.A. os deveres e responsabilidades dos administradores de companhias de economia mista são os mesmos dos administradores de companhias abertas.
Na carta, a Amec alerta que "não se pode admitir, com a devida licença, que o interesse público que justificou e autorizou a criação de uma sociedade de economia mista seja, posteriormente, transformado em interesse social como forma de justificar a prática por parte de sua administração de atos contrários ao interesse econômico da companhia".
Algumas empresas já receberam uma minuta da proposta de renovação com cláusulas consideradas "leoninas". Segundo o executivo de uma empresa, uma das propostas oferece uma tarifa por MWh menor que o custo de operação dessa usina. "Se toparmos, teremos prejuízo todo mês", afirma o executivo, para quem o governo erra ao tentar adotar um sistema com remuneração apenas para operação e manutenção em um setor que exige pesados investimentos. (Valor Econômico)
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