Nos últimos leilões de hidrelétricas, os deságios oferecidos pelos empreendedores sobre os preços-teto para a energia estabelecidos pelo governo têm sido significativos. O valor oferecido nos lances, porém, é válido somente para a parcela da produção da futura usina que é destinado às distribuidoras, no ambiente regulado. Para garantir a receita e a viabilidade dos empreendimentos, as empresas vencedoras das concorrências adotam como estratégia a venda do restante da energia por preços maiores no mercado livre. O mercado, porém, alerta para um desequilíbrio no modelo: com a forte disputa pelas usinas e os significativos deságios, a tarifa para o consumidor livre tem alcançado um nível "irreal", o que causaria insegurança tanto a investidores quanto aos grandes consumidores.
"O mercado livre não consegue absorver uma energia com os preços que têm sido tipicamente apontados (nas últimas licitações). Há uma desproporcionalidade entre os mercados livre e cativo hoje, e essa é uma grande preocupação. É necessário rever esse modelo para superar esse tipo de efeito", avalia o assessor em energia elétrica da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), Fernando Umbria.
Nas usinas de Jirau e Santo Antônio, que estão sendo construídas no rio Madeira, a parcela destinada ao Ambiente de Contratação Livre (ACL) foi de 30% da futura produção. Em Belo Monte, esse montante deve ser de 20% - outros 10% vão para o sócio autoprodutor da Norte Energia, responsável pela planta. Na usina de Teles Pires, licitada em dezembro com tarifa final de R$58,36 por MWh - a menor já registrada no País -, apenas 15% irão para os consumidores livres.
"A tendência natural é que ocorra aí algo similar ao caso das usinas do Madeira e de Belo Monte - que elevaram o preço no ACL para dar o desejado retorno aos investidores. Isso preocupa porque você começa a perceber uma pressão muito forte ao mercado livre. Não entra energia nova e, ao mesmo tempo, o que está disponível tem um preço que o mercado não está disposto a pagar", analisa o assessor da Abrace.
No caso da hidrelétrica de Belo Monte, Umbria lembra que a Eletrobras, que detém 49,9% do empreendimento, fechou acordo para ter a opção de compra da energia da usina que iria para o ACL por um preço de R$130 por MWh - valor considerado "bastante elevado" pelo executivo. A Norte Energia, que venceu o leilão pelo projeto, ofereceu um lance de R$78 por MWh para o ambiente regulado.
"Começamos a observar que há um descolamento importante dos preços (para o ACL) frente aos que foram resultado dos leilões e isso realmente preocuoa. Está fora do que seria razoável", critica Umbria.
No final do ano passado, a Energia Sustentável do Brasil (ESBR), que detém a concessão da hidrelétrica de Jirau, sentiu a reação dos consumidores aos altos preços. Em um certame promovido para vender parte da futura produção da usina, a companhia terminou por não receber nenhuma oferta para os produtos oferecidos. Os preços estabelecidos na ocasião ficaram entre R$130 e R$140 por MWh.
Para Fernando Umbria, da Abrace, o governo deveria estudar a possibilidade de novas regras para os certames. "Pensamos que é possível estabelecer um modelo de leilão de eneriga nova em que os consumidores possam participar diretamente e ter o benefício das propostas feitas na licitação", afirma o diretor, que aponta preocupação com os custos da energia para a indústria nacional. "Isso naturalmente tira competitividade". (Jornal da Energia)
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