A modalidade de pré-pagamento no setor de telefonia celular não é nenhuma novidade no Brasil. A medida, inclusive, foi bem aceita pela população. Mas qual é a reação quando o assunto é um serviço considerado essencial para a sociedade, como a energia elétrica? Embora a proposta de pré e pós-pagamento de eletricidade ainda se encontre em fase de regulamentação, algumas questões já são levantadas. A principal delas, talvez, é: quem ganhará com isso?
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) garante que o novo modelo de pagamento da conta de luz traz benefícios tanto para o consumidor quanto para as distribuidoras de eletricidade. Mas há quem discorde. Um dos pontos questionados refere-se ao custo da energia. Para Flávia Lefévre Guimarães, membro do conselho consultivo e advogada da Proteste, que defende o consumidor, na proposta apresentada não há um mecanismo que garanta que o cliente final será beneficiado.
“A adoção desse sistema proporciona uma economia e uma redução de custos para as concessionárias. No entanto, não há uma norma definitiva que garanta que os ganhos da companhia serão compartilhados com o consumidor”, aponta Flávia. “Queremos um instrumento claro, que diga que a tarifa ficará mais barata”.
De acordo com o novo regulamento, a tarifa da nova modalidade será “igual à da modalidade de faturamento tradicional, podendo a distribuidora oferecer tarifas menores para quem aderir a essas modalidades”.
Para Mariana Ferreira Alvez, advogada especialista em direitos difusos e coletivos do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), a nova modalidade de pagamento é bastante “delicada”. Portanto, precisa ser bem costurada para não dar margem a interpretações dúbias que possam, no futuro, prejudicar o consumidor.
A preocupação do Idec é principalmente com a população de baixa renda. Embora a adesão ao pré-pagamento seja facultativa, Mariana alerta que essa classe da população é bastante vulnerável à publicidade. “O consumidor que é leigo vai comprar essa ideia. Temo que esse consumidor acabe sem energia no meio do mês e fique sem um serviço essencial. O Idec preferiria que o consumidor de baixa renda fosse excluído dessa possibilidade", opina Mariana. "Você pode ficar com um celular sem crédito, mas não sem energia elétrica.”
Segundo a advogada, outras situações não foram previstas na resolução. “Pessoas analfabetas e idosas terão dificuldades de manusear esse equipamento. Quanto à compra de crédito: isso vai ser de fácil acesso a todos?”.
A Aneel lista alguns dos benefícios da nova modalidade. Dentre eles, estão a melhoria do gerenciamento do consumo de energia pelo consumidor; a maior transparência em relação aos gastos diários por meio de informações em tempo real; a flexibilidade na aquisição e no pagamento da energia; a eliminação da cobrança de multas, juros de mora e taxas de religação; e a economia no orçamento doméstico por meio da mudança dos hábitos de consumo.
Por parte da distribuidora, espera-se a redução dos custos operacionais; a diminuição da inadimplência; e a melhoria do relacionamento entre a empresa e seus consumidores, ao se evitar inconvenientes gerados por erros de leitura, faturamentos por estimativa, cortes indevidos e problemas de religação fora do prazo.
Eduardo Bernini, presidente da consultoria Tempo Giusto, lembra que a modalidade não é nova. Na Inglaterra, conta ele, o modelo é utilizado deste a década de 1980. “É algo que funciona e ,inclusive, é algo aceito socialmente”.
Mas o executivo, que presidiu os grupos AES e EDP no Brasil, faz uma ressalva quanto à vida útil dos novos equipamentos, que podem encarecer os custos das distribuidoras. “O que temos hoje é um medidor eletromecânico, que tem uma durabilidade longa. Os medidores eletrônicos - que serão utilizados na modalidade de pré-pagamento - têm uma vida útil menor".
"A Aneel não fez um ajuste na curva de depreciação desses equipamentos e esse é um ponto que também merece debate”, destaca Bernini. De acordo com o consultor, isso poderia desmotivar a adesão por partes das companhias.
A minuta de resolução que busca regulamentar as modalidades de pré-pagamento e pós-pagamento de energia elétrica ficara em audiência pública até 25 de setembro. (Jornal da Energia)
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