quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

"Linhão" deverá gerar encomendas de mais de R$ 1 bi

A tecnologia de última geração que será utilizada na linha de transmissão que vai trazer a energia da hidrelétrica de Belo Monte para a região Sudeste é tanto elogiada como criticada por diferentes alas do setor elétrico. A linha vai transportar a energia em ultra-alta tensão, de 800 mil volts (Kv), em corrente contínua. Só existem três linhas desse tipo no mundo, duas na China e uma na Índia. As linhas existentes no Brasil transmitem no máximo em 500 Kv. Quanto maior a voltagem, menor a perda de energia.

"Essa tecnologia é o estado da arte", afirma o presidente do conselho de administração da Associação Brasileira da Associação Brasileira da Indústria Eletro Eletrônica (Abinee), Newton José Leme Duarte, para quem a construção do linhão de Belo Monte será uma "excelente" oportunidade para o Brasil.

Segundo ele, três grupos europeus - Siemens, Alstom e ABB - dominam a tecnologia para produzir os equipamentos de transmissão em 800 mil volts, além dos fabricantes chineses. Na avaliação de Duarte, essas grandes multinacionais europeias teriam condições de produzir equipamentos no Brasil, ou pelo menos uma parte deles.

O coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel), ligado à Universidade Federal do rio de Janeiro, Nivalde de Castro, pensa o oposto. Segundo ele, ao adotar uma tecnologia inédita, o Brasil ficará refém dos fabricantes asiáticos. Na avaliação de Castro, como os equipamentos são fabricados na China, a gigante chinesa State Grid ganhará ainda mais vantagens competitivas na disputa do leilão para construção da linha de transmissão de Belo Monte, que será realizado no dia 07 de fevereiro.

"Os chineses virão com a tecnologia debaixo do braço. O que interessa para a China é gerar contratos para as suas fábricas", diz Castro. Segundo ele, o governo brasileiro deveria ter levado questões como transferência de tecnologia, geração de empregos e capacitação das fábricas brasileiras para atender as encomendas. A construção do linhão de Belo Monte é uma obra estimada em torno de R$ 5 bilhões.

Só as encomendas de equipamentos (como transformadores) para as duas subestações devem gerar receita de mais de R$ 1 bilhão para os fabricantes. A Abinee estima que cada subestação custe em torno de R$ 500 milhões.

O BNDES restringe a utilização de equipamentos estrangeiros para conceder empréstimos, o que obriga os consórcios que disputam leilões de infraestrutura a buscar fornecedores locais. Mas, no caso da China, o governo pode oferecer linha de crédito, afirma Castro.

"Com essa linha, o Brasil vai estar na vanguarda da transmissão em corrente contínua", disse Mauricio Tolmasquim, presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), braço de planejamento do setor elétrico do governo federal.

"Esse tipo de linha é próprio de um país continental como o Brasil, onde a fonte de geração está muito distante da carga [consumo]. A corrente contínua se adequa bastante a essas condições", acrescentou Tolmasquim, que visitou ontem o laboratório de ultra-alta tensão do Cepel em Adrianópolis (RJ), onde será possível testar equipamentos para a futura linha de transmissão.

A hidrelétrica de Belo Monte será a terceira maior do mundo, com 11.233 megawatts (MW) de capacidade instalada. Segundo Tolmasquim, assim como ocorreu no leilão da hidrelétrica, que contou com apenas dois consórcios participantes, a expectativa é que o leilão da linha de transmissão também atraia um pequeno número de interessados. "Em obras muito grandes, apenas grandes empresas têm condição de participar".

O presidente da EPE disse ainda não acreditar em entraves ambientais significativos para construção da linha, apesar do porte do empreendimento. Segundo ele, o projeto já foi amplamente estudado. (Valor Econômico)
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