Uma nova prorrogação dos contratos de energia elétrica que vencem entre 2015 e 2017 é questionável do ponto de vista constitucional, segundo o ex-ministro da Defesa e ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Nelson Jobim. Para ele, que falou na abertura do 13º Encontro Internacional de Energia, da Fiesp, as concessões, cuja idade média é de 56 anos, só foram prorrogadas em 1995 porque não havia na ocasião clima político para que elas fossem licitadas novamente. O Brasil vivia ainda um momento de transição. O impeachment do presidente Fernando Collor de Mello era recente, e o então presidente Fernando Henrique Cardoso acabara de assumir a Presidência, como relembrou Jobim.
"O que estava em discussão em 1995 era um efeito da transição porque em 1988, 1989, 1990, 1991 e 1992 não havia condições políticas de abrir esse debate em face de desordem que se estabeleceu. E, como eram serviços públicos essenciais, não poderia haver interrupção", avaliou o ex-ministro do Supremo.
Hoje, o momento é outro, segundo ele. "A circunstância de fato era o convívio do regime novo com o regime antigo. Isso se esgotou. Lá se vão 20 anos e agora se fala numa transição, mas transição do quê? Uma transição que se inicia 20 anos depois de ter sido regulamentada?", questionou Jobim. Ele também ressaltou que as premissas políticas acabam influenciando a questão.
Jobim foi além. Disse que a questão atual é maior, atingindo a transparência dos contratos. "Num momento em que o próprio governo federal edita uma lei de transparência das informações de forma radical, a opção, portanto, é a seguinte: ou deixamos que o preço da energia seja fixado e estabelecido pela via do debate público da licitação, ou deixamos que esta tarifa seja o resultado de um ajuste às sombras do gabinete das autoridades", enfatizou Jobim. "Assistiremos a um diálogo ou a um monólogo?", completou.
Entre 2015 e 2017 expiram contratos que abrangem 28% da geração de energia do país, 73 mil quilômetros de linhas de transmissão e 37 distribuidoras que atendem a milhões de brasileiros. A maioria dos contratos está nas mãos de estatais como Eletrobrás, Cesp e Cemig.
Para outra ex-presidente do Supremo Tribunal Federal presente ao encontro, Ellen Gracie, qualquer decisão do governo sobre o assunto não poderá ser regulada via Medida Provisória (MP), como o governo tem indicado que fará, mas terá de ser feita por alteração legislativa, sendo que a modificação terá de ser aprovada na Câmara Federal e no Senado.
"O objetivo de renovar concessões só pode ser alcançado mediante alteração legislativa. Hoje nós temos um marco legal que proíbe a renovação dessas concessões", explicou Ellen Gracie, que qualificou que as concessões em discussão assemelham-se a capitanias hereditárias, referência ao sistema de divisão de território durante a colonização portuguesa no Brasil no século XVI.
A ex-presidente do STF também ressaltou que o tema pode suscitar questionamentos em outras esferas, inclusive com eventuais infrações ao Código Penal. Isso ocorre porque algumas pessoas envolvidas na discussão dizem que é preciso prorrogar de novo as concessões, porque não haveria tempo hábil para promover as licitações. "Há algum tempo se dizia que era muito cedo para tomar providências necessárias e, logo em seguida, se dirá que já é muito tarde e não há mais tempo. Cabe ressaltar que o Código Penal pode penalizar o servidor público que não tomou a decisão no seu tempo", alertou Ellen Gracie.
A Fiesp está de olho na discussão jurídica. O debate remete à Lei 9.074, de 1995, promulgada em meio à privatização do setor elétrico. As empresas desestatizadas foram compradas em leilões por companhias privadas, que pagaram pelo direito de explorar o serviço público. Para essas empresas, as concessões foram "zeradas" e dadas por 30 anos, com possibilidade de renovação - regra que vale também para novas usinas de geração. Já, no caso de ativos que não foram privatizados, algumas concessões foram prorrogadas por mais vinte anos, prazo que se encerram portanto a partir de 2015.
No entendimento de alguns advogados, não poderia haver nova prorrogação. O artigo 175 da Constituição determina que o poder público tem a incumbência de prestar um serviço público diretamente ou por meio de concessão ou permissão, "sempre através de licitação". A Lei de 2004, que fixou novas bases do setor elétrico, também reforçaria a necessidade de licitação sob o critério da menor tarifa. (Valor Econômico)
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"O que estava em discussão em 1995 era um efeito da transição porque em 1988, 1989, 1990, 1991 e 1992 não havia condições políticas de abrir esse debate em face de desordem que se estabeleceu. E, como eram serviços públicos essenciais, não poderia haver interrupção", avaliou o ex-ministro do Supremo.
Hoje, o momento é outro, segundo ele. "A circunstância de fato era o convívio do regime novo com o regime antigo. Isso se esgotou. Lá se vão 20 anos e agora se fala numa transição, mas transição do quê? Uma transição que se inicia 20 anos depois de ter sido regulamentada?", questionou Jobim. Ele também ressaltou que as premissas políticas acabam influenciando a questão.
Jobim foi além. Disse que a questão atual é maior, atingindo a transparência dos contratos. "Num momento em que o próprio governo federal edita uma lei de transparência das informações de forma radical, a opção, portanto, é a seguinte: ou deixamos que o preço da energia seja fixado e estabelecido pela via do debate público da licitação, ou deixamos que esta tarifa seja o resultado de um ajuste às sombras do gabinete das autoridades", enfatizou Jobim. "Assistiremos a um diálogo ou a um monólogo?", completou.
Entre 2015 e 2017 expiram contratos que abrangem 28% da geração de energia do país, 73 mil quilômetros de linhas de transmissão e 37 distribuidoras que atendem a milhões de brasileiros. A maioria dos contratos está nas mãos de estatais como Eletrobrás, Cesp e Cemig.
Para outra ex-presidente do Supremo Tribunal Federal presente ao encontro, Ellen Gracie, qualquer decisão do governo sobre o assunto não poderá ser regulada via Medida Provisória (MP), como o governo tem indicado que fará, mas terá de ser feita por alteração legislativa, sendo que a modificação terá de ser aprovada na Câmara Federal e no Senado.
"O objetivo de renovar concessões só pode ser alcançado mediante alteração legislativa. Hoje nós temos um marco legal que proíbe a renovação dessas concessões", explicou Ellen Gracie, que qualificou que as concessões em discussão assemelham-se a capitanias hereditárias, referência ao sistema de divisão de território durante a colonização portuguesa no Brasil no século XVI.
A ex-presidente do STF também ressaltou que o tema pode suscitar questionamentos em outras esferas, inclusive com eventuais infrações ao Código Penal. Isso ocorre porque algumas pessoas envolvidas na discussão dizem que é preciso prorrogar de novo as concessões, porque não haveria tempo hábil para promover as licitações. "Há algum tempo se dizia que era muito cedo para tomar providências necessárias e, logo em seguida, se dirá que já é muito tarde e não há mais tempo. Cabe ressaltar que o Código Penal pode penalizar o servidor público que não tomou a decisão no seu tempo", alertou Ellen Gracie.
A Fiesp está de olho na discussão jurídica. O debate remete à Lei 9.074, de 1995, promulgada em meio à privatização do setor elétrico. As empresas desestatizadas foram compradas em leilões por companhias privadas, que pagaram pelo direito de explorar o serviço público. Para essas empresas, as concessões foram "zeradas" e dadas por 30 anos, com possibilidade de renovação - regra que vale também para novas usinas de geração. Já, no caso de ativos que não foram privatizados, algumas concessões foram prorrogadas por mais vinte anos, prazo que se encerram portanto a partir de 2015.
No entendimento de alguns advogados, não poderia haver nova prorrogação. O artigo 175 da Constituição determina que o poder público tem a incumbência de prestar um serviço público diretamente ou por meio de concessão ou permissão, "sempre através de licitação". A Lei de 2004, que fixou novas bases do setor elétrico, também reforçaria a necessidade de licitação sob o critério da menor tarifa. (Valor Econômico)
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