Até 2020, o Brasil deverá triplicar a oferta de gás natural ao atingir 200 milhões de metros cúbicos, dos quais um terço será importado ante os atuais 50%. O consenso entre especialistas e entidades como a Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim) e a Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industrias de Energia e de Consumidores Livres (Abrace) é de que o país precisa definir que o destino dará à produção e elaborar um plano e uma política industrial para o segmento. O consumo interno gira em torno de 65 milhões de metros cúbicos, podendo chegar a 85 milhões quando há necessidade de uso de gás para as térmicas.
Do total, 50% é de consumo térmico, 30 milhões de demanda industrial, 8 milhões de petroquímica, 5 milhões de GNV e 1 milhão de consumo doméstico. "Falta um plano para a área de gás natural, porque vamos viver um paradoxo da elevação da produção nacional a patamares três vezes superiores à atual, em função das reservas do pré-sal, e o fato de que, mantidas as condições atuais de mercado, não haverá demanda para absorver a produção. Isso em função de entraves, como o fato de as térmicas não funcionarem o tempo todo a pleno vapor e a estrutura de preços não atender às demandas da indústria e do setor petroquímico", diz Marco Tavares, presidente do conselho da Gas Energy, consultoria especializada em gás natural.
Hoje, as térmicas funcionam como complemento às hidrelétricas. Há necessidade, segundo ele, de que a oferta seja flexível e ocorra somente quando as hidrelétricas precisam que as térmicas entrem em operação. O gás que é entregue de vez em quando não existe. As produtoras têm que remunerar o gás produzido, que não pode ficar parado. O volume para as térmicas varia de 10 milhões a 12 milhões de metros cúbicos em período de crise energética, provocada por falta de chuvas. "Se o gás não é associado ao petróleo quando for produzido, e efetivamente comercializado, a produtora teria que cobrar da térmica pelo tempo em que ficou parado", diz Tavares. No caso do pré-sal, o gás é associado, sendo produzido junto com o petróleo.
Se não for consumido, tem quer ser queimado, mas há limites ambientais para a queima do gás, e o caminho seria a redução da produção de petróleo. "Disso se pode concluir que o gás do pré-sal não é compatível com o consumo térmico". Se a térmica exige flexibilidade de gás, a indústria não amplia a oferta em função do preço, que gira em torno de US$ 4 cobrados dos Estados Unidos e superior aos US$ 10 da Europa. Paulo Pedrosa, presidente-executivo da Abrace, diz que a oferta de gás só tende a crescer com as descobertas de gás não associado no Maranhão e em Minas Gerais.
O Brasil Poderia usar esta oportunidade para ampliar sua competitividade. "Nos Estados Unidos, começa a se verificar a recuperação da produção industrial e parte se deve ao preço do gás, que em alguns lugares chega a US$ 3 na porta da fábrica. Se nós não tivemos uma política para o gás, nossa competitividade ficará ainda pior", diz Pedrosa.
Ele defende que seja alterada a atual estrutura de distribuição de gás, que envelheceu e não reflete as necessidades internas. "Montou-se um setor com uma lógica que não existe mais. O que vai se fazer com o gás é uma decisão do país, que pode usar o insumo para seu desenvolvimento". Entre as medidas sugeridas pela Abrace está a desvinculação do preço do gás do preço do petróleo, que Pedrosa classifica como uma das alavancas da revolução do shale gas (encontrado nas rochas de xisto) nos Estados Unidos. É preciso ainda garantir formas de escoamento de gás com infraestrutura de transporte.
E, por fim, o modelo de distribuição precisa mudar. "Há distribuidora com remuneração garantida de 20%. Isso é incompatível com o Brasil de hoje. O modelo é velho. Não se podem quebrar contratos, mas precisamos rediscutir o modelo". A indústria petroquímica reivindica uma política industrial para o gás, porque seus produtos competem com empresas globais que têm baixo custo de energia. Um exemplo são as petroquímicas americanas, que renasceram quando se quebrou o paradigma de produção, descobrindo-se novas tecnologias de perfuração, o que viabilizou a produção do shale gas a custo reduzido e em larga escala.
O barateamento do custo do gás no Brasil permitiria, inclusive, reduzir o déficit da balança comercial de produtos químicos, que, segundo a Abiquim, chega a US$ 26,9 bilhões, dos quais US$ 2,7 bilhões de produtos petroquímicos. A petroquímica brasileira utiliza a nafta como matéria-prima. Há só uma planta a gás da Braskem no Rio, e, no futuro, a central petroquímica do Comperj.
Segundo Fátima Gioavana, diretora de economia e estatística da Abiquim, além de ser a maior usuária do setor industrial de gás, a indústria química é a única que utiliza o gás como matéria-prima. "A Abiquim está pleiteando que se aplique o que está previsto na Lei do Gás. de maio de 2009, de que caberá ao Conselho Nacional de Política Energética a adoção de políticas que deem competitividade para o uso do gás natural como matéria-prima. O que queremos é uma redução do preço do gás das distribuidoras para usos químicos da cadeia do C1." ( Valor Econômico)
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