O setor de energia, no Brasil e no mundo, é marcado pela complexidade de suas bases institucionais, tecnológicas, econômicas, socioambientais e regulatórias. Outra característica importante deste setor é que suas lógicas de planejamento, expansão e operação são regidas por horizontes de longuíssimo prazo. Portanto, ações que estão sendo implementadas hoje são frutos de decisões tomadas vários anos atrás e geralmente fazem parte de arranjos contratuais medidos em décadas. Como corolário, conclui-se que as decisões tomadas hoje deverão influenciar os cenários energéticos que serão vividos por algumas gerações além da nossa.
A política tarifária é uma das dimensões do setor de energia elétrica que mais sentem os efeitos dessa correlação raramente percebida entre "arranjos contratuais passados" e "efeitos presentes". Isso faz com que a tarifa de setores regulados seja um dos assuntos mais mal compreendidos e mal interpretados no mundo da infraestrutura.
A única fonte de receitas para a manutenção da cadeia de valor do setor elétrico (geração, transmissão e distribuição de energia) é a tarifa, que corresponde à definição econômica para "preço regulado". A tarifa corresponde ao preço de um serviço público definido de acordo com as regras de um contrato de concessão. Como os contratos são de décadas, tarifas precisam ser ajustadas - ou reguladas - ao longo do tempo por critérios técnicos e econômicos de forma a atender também às exigências de qualidade definidas no mesmo contrato.
Quando o "curto-prazismo", o populismo e outros "ismos" invadem a arena da regulação nos setores de infraestrutura, o resultado é sempre negativo. Pela proximidade, fiquemos apenas com exemplos de nossos vizinhos.
Na Argentina, os apagões elétricos são o resultado do populismo da era Kirchner que congelou as tarifas de forma artificial. Na Venezuela, a ideologia bolivariana, que acabou com padrões mínimos de gestão empresarial - em prol da ocupação político-partidária -, provocou a deterioração da infraestrutura energética do país, que vive em racionamento. Nós podemos aprender com essas lições.
Além disso, a Teoria da Regulação, extremamente jovem, passa por um período de maturação em escala global. Os maiores especialistas mundiais são humildes o suficiente para admitir que a regulação está em construção. Assim, qualquer passo novo que se dê nesta verdadeira fronteira do conhecimento - como novas metodologias para definição de tarifas e novos modelos estatísticos para balizar padrões de serviço - exige do regulador extrema cautela, porque ainda não há conhecimento e bases de dados acumulados que nos permitam, olhando para a frente, delinear trajetórias de longo prazo imunes ao risco de geração de desequilíbrios irreversíveis.
É com essa mesma humildade que o Brasil precisa fazer as seguintes perguntas: temos um "norte" para as políticas tarifárias de energia? Nossas decisões regulatórias buscam quais objetivos? Há lições internacionais que podem ser aplicadas ao Brasil?
De forma mais ampla, quais seriam os princípios norteadores para que o setor de energia evite os perigosos "ismos" (populismo, "curto-prazismo", oportunismo) e para que caminhemos para uma situação de equilíbrio sustentável, com consumidores satisfeitos com a qualidade e o preço da energia e com empresas sadias e capazes de vencer os desafios de expansão da oferta?
O "norte" do parágrafo acima somente será visualizado com lentes de longo prazo. A política tarifária e três outros temas que definirão as fronteiras e cenários de longo prazo do setor de energia serão debatidos nos dias 22 e 23 de agosto, em São Paulo, no congresso Brazil Energy Frontiers (www.brazilenergyfrontiers.com). Durante dois dias, líderes intelectuais internacionais e nacionais contemplarão lições globais e realidades locais em busca de respostas aos desafios energéticos que o Brasil enfrentará nas próximas décadas. Autor: Claudio J. D. Sales (O Estado de S. Paulo)
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