segunda-feira, 2 de maio de 2011

Energia cara e serviço ruim

Editorial
Além da repercussão interna da alta dos preços das commodities no mercado internacional, da demanda ainda aquecida e da continuidade da expansão do crédito, os preços administrados são outro sério obstáculo na luta contra a inflação que preocupa o governo. Um destes preços é o da energia elétrica. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) vem autorizando reajustes de tarifas às concessionárias de 9% a 11%, em média, muito acima da inflação medida pelo IPCA (6,34% nos últimos 12 meses findos em março). As concessionárias têm o direito contratual de corrigir anualmente as suas tarifas, mas a agência reguladora, em mais de um caso, concedeu às empresas de energia elétrica reajustes superiores aos que elas próprias solicitaram. A Cemig, por exemplo, solicitou um aumento de tarifas de 8,8%, que a Aneel considerou insuficiente, autorizando a empresa a aumentar em 9,02% o preço da eletricidade fornecida à indústria.

O problema não é de hoje. Reportagem da Folha de S.Paulo (28/4) mostrava que, enquanto o IPCA teve uma alta acumulada de 86% nos últimos dez anos, as tarifas de eletricidade subiram nada menos que 186% no mesmo período. Isso pesa no bolso do consumidor residencial, com a agravante de que, com a melhoria de renda da população, cresceu muito o uso de eletrodomésticos no País.

Ainda mais afetadas são as empresas comerciais e industriais e, particularmente, o setor industrial exportador. Além de arcar com encargos e tributos abusivos, como todas as empresas, as indústrias têm de cortar custos ao máximo para poder competir, em vista do câmbio sobrevalorizado, e, ainda por cima, pagar pela energia que consomem um preço mais elevado que os cobrados nos países desenvolvidos.

É verdade que o total de impostos cobrados pelos entes estatais é absurdo. Há isenções e tarifas sociais para as classes de menor renda, de acordo com o programa Luz para Todos, que o governo pretende prorrogar até 2014, e que representa 3% na conta de luz, mas está longe de ser o item mais pesado. Segundo especialistas, ao todo 12 tributos e 11 contribuições incidem sobre tarifa de eletricidade. O grande vilão, parcialmente encoberto nas contas de luz, é o ICMS. Em São Paulo, a alíquota do imposto é de 25%, mas chega a 36%, uma vez que a base de cálculo final do tributo incorpora todas as taxas e contribuições, incluindo novamente o ICMS já cobrado.

Será muito difícil reduzir essa fonte de arrecadação, enquanto os gastos do setor público em geral não forem controlados. Mas os problemas não param aí. É claro que a revisão tarifária prevista nos contratos de concessão entre as empresas e o governo federal tem que levar em conta os custos da distribuição, cabendo à agência reguladora estabelecer o teto dos preços a serem praticados. Mas isso presume que a Aneel adote parâmetros para esses custos. É ridícula, para dizer o mínimo, a alegação da agência reguladora de que a fórmula de reajuste inclui "os ganhos de produtividade e eficiência das empresas (fator X), que são compartilhados com os consumidores ao reduzir o impacto dos reajustes".

Bem ao contrário. Os aumentos despropositados concedidos pela Aneel depõem contra a eficiência das distribuidoras de eletricidade. Seus serviços são em geral precários, como provam os blecautes cada vez mais frequentes em todas as regiões do País. Sob o aspecto financeiro, há concessionárias em boa situação, bastante lucrativas, outras em situação difícil e outras deficitárias ou em processo de reestruturação e saneamento de suas contas. Mas todas terão reajuste de tarifas bem superiores à inflação, e que tendem a prevalecer apesar dos protestos. Em Salvador, onde a Coelba, com autorização da Aneel, aumentou as contas de luz em 9,92% para as residências e 10,16% para as indústrias, a Prefeitura entrou com ação na Justiça contra a cobrança abusiva.

Se a presidente Dilma Rousseff, que foi ministra de Minas e Energia, está disposta a trabalhar firmemente, como afirmou, para evitar que a inflação dispare, terá de mexer na caixa-preta em que se transformou o setor elétrico. (O Estado de S. Paulo)
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