Diluída em 68,8 milhões de contas, essa cobrança de taxas especiais passa despercebida pela maioria da população. Mas, somada aos impostos, já representa 45,6% do custo para acender a luz da sala, ligar o chuveiro ou colocar uma máquina industrial para funcionar.
A existência dessa carga tributária setorizada é vista com naturalidade por especialistas, uma vez que é preciso ter recursos para garantir a execução de alguns serviços. O problema é que o governo tem prorrogado encargos que já deveriam ter sido extintos e usado o dinheiro para outros fins. "De pouquinho em pouquinho, os encargos e impostos já dão metade da conta. Isso gera um problema de distorção muito grave", pondera Elena Landau, consultora do escritório de advocacia Sérgio Bermudes.
O efeito mais claro desta distorção é a perda de competitividade da indústria, especialmente daquelas em que a energia é parte importante do custo do produto, como alumínio e aço. Mas o consumidor arca com a elevação do custo de vida. "É ruim para todo mundo: para o consumidor que paga mais caro e para a indústria que perde competitividade", alerta Reginaldo Medeiros, presidente da Associação Brasileira de Comercializadores de Energia (Abraceel).
Na visão de Cláudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil, todo e qualquer sistema tributário deveria atender a cinco propriedades: eficiência, simplicidade, transparência, equidade e flexibilidade. "No que diz respeito ao volume de encargos cobrados na conta de luz, essas prioridades estão longe de ser atendidas", diz.
Transparência. Uma das maiores reclamações de especialistas é a falta de transparência, por parte do governo, na hora de explicar onde o dinheiro arrecadado está sendo usado. O exemplo mais gritante envolve a Reserva Geral de Reversão (RGR), cobrada desde 1957. O encargo foi criado para garantir uma espécie de poupança para a União, que seria usada para pagar, por exemplo, por hidrelétricas construídas caso não houvesse uma renovação da concessão pública cedida para uma empresa. Essa reversão, entretanto, nunca aconteceu. Ainda assim a cobrança continua sendo feita.
Para piorar a situação, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva resolveu incluir a prorrogação da RGR, por mais 25 anos, no texto de uma Medida Provisória encaminhada ao Congresso na virada do ano. Uma das justificativas para a decisão foi que o encargo bancava parte do programa Luz para Todos. "A RGR não é para isso", pondera Elena Landau, ao lembrar que a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) já cumpre essa função.
A Conta de Consumo de Combustíveis (CCC) é outra que deveria ter sido extinta, mas acabou prorrogada. O dinheiro arrecadado é usado para bancar as usinas termoelétricas que geram energia para os moradores do Norte do País. Mesmo com a conexão do Acre e Rondônia ao Sistema Interligado Nacional (SIN) de energia - o que diminui o uso das térmicas - o governo esticou até 2022 a cobrança da CCC e ainda aumentou o peso de outro encargo para "compensar perdas eventuais" dos dois Estados do Norte.
"A palavra-chave aqui é transparência. O consumidor precisa saber o que está pagando, para onde o dinheiro está indo e quanto custa, efetivamente, a energia no País", afirma Landau. "Como não tem transparência, o consumidor reclama que está pagando muito, mas não sabe para quem. Ele não entende a conta, culpa a distribuidora, mas não sabe que menos de um terço do que paga vai para a Light ou Eletropaulo". (O Estadod de S. Paulo)
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