Um dos maiores desafios para o novo governo é decidir o que fazer com as concessões do setor elétrico que vencem nos próximos anos. O desafio é preocupante já que de 2015 a 2017 vencem concessões de 58 hidrelétricas, com capacidade de 21.500 MW - duas Belo Monte. Expiram também as concessões de 73 mil km de linhas de transmissão, mais de 50% de todas as linhas em operação. Pela legislação atual essas concessões não têm direito à renovação. Se elas forem licitadas ocorrerá uma desestatização em massa, atingindo ativos importantes das subsidiárias da Eletrobrás, mas também da Cesp, da Cemig e da CTEEP.
A possibilidade de renovar as atuais concessões vem sido discutida, mas isto implica na alteração da legislação do setor elétrico. Isso porque o marco legal - Lei 9.074/1995 - prevê que ao término das concessões os ativos revertem para a União devendo ser licitados, cabendo ainda ao antigo concessionário compensações por investimentos que não estejam depreciados.
Se o novo governo deseja promover a prorrogação das concessões, deve fazê-lo logo, pois a situação atual gera incertezas, tanto no mercado acionário como, principalmente, nas decisões de investimento e na obtenção de financiamento. Ainda que se opte pela licitação, há uma série de dúvidas pendentes. Não há, por exemplo, segurança jurídica a respeito da fórmula para calcular a indenização aos antigos concessionários por investimentos realizados e não amortizados, que não são poucos.
O que parece mais sensato e realista é propor uma renovação para os atuais detentores das concessões, mas usando uma fórmula que traga benefícios para todos os consumidores. É o que tem sido chamado de "renovação com oneração" - oneração para o atual concessionário. A experiência internacional pode ajudar. Na reformulação do setor elétrico nos anos 90 o governo de Québec adotou uma solução nesta linha. A estatal Hydro-Quebéc continuou de posse de todas as suas usinas, mas foi obrigada a suprir 80% da energia da distribuidora local por um preço bastante inferior ao preço de mercado. Deste modo, os consumidores - residenciais e industriais - se beneficiaram do fato de a região possuir hidrelétricas já amortizadas. Semelhante decisão pode ser adotada no Brasil: permitir a prorrogação das concessões antigas, criando ao mesmo tempo um mecanismo que beneficie os consumidores. Trata-se de uma oportunidade única para aplicar um tarifaço às avessas e assim reduzir estruturalmente o custo da energia no Brasil.
Colocar em leilão quantidade tão expressiva de usinas hidrelétricas e linhas de transmissão em nada contribui para resolver o principal desafio do setor elétrico que é garantir, como novos investimentos, o suprimento de energia a preços competitivos internacionalmente. Mas o fim das concessões pode ser uma oportunidade de diminuir o custo da energia para usuário final, contribuindo para reduzir a conta de luz das famílias brasileiras e baratear os custos para a indústria. Autor: Nivalde J. de Castro e Roberto Brandão (O Estado de S. Paulo)
.