quinta-feira, 27 de maio de 2010

Opinião: Força da Bioeletricidade

As fontes renováveis de energia responderam por 47,3% da nossa matriz energética, em 2009, impulsionadas pelo avanço do etanol combustível, segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE). O sucesso dos veículos flex fuel, que respondem por 93% do total de carros novos vendidos, traz também para a vitrine outra fonte energética renovável, com potencial formidável e ainda subutilizada no Brasil: a bioeletricidade da cana.

Um país que almeja crescer com sustentabilidade não pode prescindir de uma matriz energética diversificada, ambientalmente correta e economicamente viável. Sobre este tripé reside o desafio de impulsionarmos o uso da bioletricidade da cana, uma energia produzida com tecnologia genuinamente nacional e que caminha ao lado da expansão do setor sucroenergético.

Recentemente, o Congresso de Cogeração de Energia 2010 foi palco de debates substantivos acerca dos planos do governo para incentivar à cogeração de energia, quanto às linhas de financiamento existentes e o apoio de bancos de investimentos aos projetos, os aspectos regulatórios, as experiências bem sucedidas e os desafios para melhorar a eficiência energética nos processos industriais.

Ao longo de 2009, ano em que a crise global comprometeu a saúde financeira de boa parte do setor o que acabou precipitando uma profunda reestruturação na cadeia produtiva, chama a atenção os dados do Ministério de Minas e Energia (MME). Eles apontam para uma exportação de bioeletricidade da ordem de 5.872GWh, no ano passado, um valor 33% superior ao de 2008, 4.409GWh.

Em termos de número de usinas exportando bioeletricidade, o crescimento foi superior a 10%, passando de 88 unidades para 100 unidades conectadas ao Sistema Interligado Nacional. A bioeletricidade exportada ao longo de 2009, representou mais de 6% da energia produzida pela usina de Itaipu ou foi equivalente a duas vezes a produção anual da Usina Três Irmãos da Cesp (Companhia Energética de São Paulo).

Quando observamos a capacidade instalada, a bioeletricidade acrescentou 1.112 MW de potência instalada nova, superando todas as demais fontes, incluindo as grandes hidrelétricas e as térmicas convencionais. Somente a bioeletricidade representou 31% da capacidade instalada nova, significando acrescentar, em apenas um ano, o equivalente a 8% da potência total de Itaipu ou 10% do aproveitamento de Belo Monte.

Todavia, os dados futuros de capacidade instalada nova a ser agregada anualmente pelas usinas a biomassa causam preocupação: de 1.112MW em 2009 passaremos para apenas 484MW em 2013, representando uma queda de 56% no período. Enquanto isso, as térmicas convencionais, poluidoras e caras, saem de um patamar de 1.111MW, em 2009, para agregarem, apenas em 2013, um total de 5.304MW de capacidade instalada nova.

Isso demonstra a ausência de uma política setorial capaz de definir o papel da bioeletricidade na matriz energética nacional, por meio da consolidação das decisões políticas sob metas claramente predefinidas, além de continuidade e planejamento na condução das ações para atingir tais metas.

Nesta linha, vale destacar a decisão do MME de promover um leilão de energia de reserva para as fontes alternativas, ainda neste semestre, para contratar energia a partir de 2013. Ainda que a sua formatação não seja a adequada, pois é importante que a contratação ocorra por fonte (devido às especificidades da biomassa, eólica e PCHs), a retoma de leilões dedicados é importante diretriz para início da correção de percurso no planejamento energético.
Seguramente, o sucesso na perenidade da inserção das fontes alternativas na matriz energética passa necessariamente tanto pela regularidade de leilões que contemplem suas especificidades, mas também é condição imprescindível a definição de patamares de preço no Ambiente de Contratação Regulada, incorporando o conceito de externalidades, capazes de remunerar os investimentos, além da garantia de compra da energia excedente.

A política setorial a ser delineada também deve estabelecer diretrizes para o financiamento, o tratamento fiscal a ser dado para a cadeia produtiva, além de discutir os critérios quanto ao encargo de conexão, gargalo histórico para as fontes alternativas.

A Unica – União a Agroindustria da Cana-de-Açúcar, argumenta que a bioeletricidade sozinha tem potencial suficiente para representar 14% da matriz energética em apenas dez anos (safra 2020/21). Ou seja, temos o privilégio de contar com uma fonte renovável, de baixa emissão de carbono, complementar à hidroeletricidade, e que conta com projetos de rápida implantação e baixo impacto ambiental.

Em suma, dispomos da oportunidade real de repetir o sucesso do Proálcool, na década de 70, e nos consolidarmos como uma referência mundial no quesito matriz energética limpa, renovável, barata e abundante. Resta-nos implantar uma política setorial consistente e duradoura, capaz de assegurar um melhor planejamento, estabilidade e previsibilidade, no sentido de atendermos a atual demanda e começarmos a pavimentar o caminho rumo à liderança mundial no setor de energias renováveis!

Deputado Arnaldo Jardim (PPS-SP) – membro da Comissão de Minas e Energia e coordenador da subcomissão de Eficiência Energética da Câmara Federal.