segunda-feira, 19 de abril de 2010

Fiscalização da Aneel sobre o blecaute de 2009: contingências, encargos e multas

Por Excelência Energética
Em 10 de novembro de 2009, o sistema interligado nacional (SIN) sofreu blecaute nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Mato Grosso do Sul, e rejeições de carga no Nordeste e em Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso, Acre e Rondônia, com isolamento da hidrelétrica de Samuel e da Termonorte II. O apagão foi consequência do desligamento dos circuitos 1, 2 e 3 da linha de transmissão de 765KV, 60 Hz, que sai da subestação Ivaiporã e chega à subestação Itaberá. Em decorrência desses desligamentos e das condições de operação do sistema, ocorreram outros desligamentos em cascata, de 10.593MW, que culminaram numa interrupção total de 24.436MW, o correspondente a 40% das cargas do SIN.

Em reunião do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) realizada no próprio mês de novembro de 2009, ficou determinado que o ONS adotasse o modelo de contingência tripla, denominado de “N-3”, até que a empresa Furnas concluísse as mudanças na subestação Itaberá. As mudanças correspondem à instalação do chamado chapéu chinês, um dispositivo conhecido por booster-shed constituído por uma espécie de saia isolante bem pronunciada, que é instalada no topo dos isoladores, aumentando assim a distância dielétrica dos isoladores em período chuvoso, o que os coloca com capacidade disruptiva perto da dos isoladores em tempo seco. A conclusão da instalação do chapéu chinês nos isoladores e a implantação de blindagem nessa mesma subestação, está prevista para o dia 25 de abril e 31 de maio, respectivamente.

Dessa decisão para cá, parte da energia disponível na usina hidrelétrica de Itaipu, em 60Hz, e nas usinas hidráulicas da região Sul, passou a não ser despachada e transmitida para a região Sudeste. O intuito dessa sistemática escolhida pelo Operador Nacional do Sistema (ONS) foi de garantir a segurança da operação do SIN, em decorrência das restrições elétricas impostas pelo sistema de transmissão de 765KV de Furnas.

Em razão da decisão, o ONS adotou medidas para compensar a restrição imposta, que acarretaram dispêndios adicionais na ordem de R$12 milhões por dia com o despacho de geração térmica fora da ordem de mérito, que repercutirão na tarifa na forma de Encargos dos Serviços de Sistema (ESS) pagos pelos consumidores. Caso a afluência nos reservatórios das regiões Sudeste e Sul não tivesse se mostrado altamente favorável, poderiam ocorrer repercussões mais graves do que a elevação de encargos.

Segundo o relatório de fiscalização publicado pela Aneel no dia 29 de março, que teve como objetivo verificar as causas e consequências do ocorrido, o SIN estava preparado para suportar até duas contingências, como seria a hipótese de perda de dois circuitos de 765KV. Isso quer dizer que a operação do sistema, conforme determinada pelo ONS, não estava preparada para uma tripla contingência, o que seria, por exemplo, a perda dos três circuitos de 765KV, conforme ocorrido em novembro passado.

Cumpre ressaltar que, de fato, o regime de operação em tripla contingência apresenta maior nível de segurança para o sistema. Entretanto, requer a geração complementar de outras usinas, mormente termelétricas, de custo mais elevado, como ocorre até o presente mês de abril.

Assim que as mudanças na subestação de Furnas estiverem completamente implantadas, o ONS proporá ao CMSE o retorno ao regime de contingência dupla. Será a partir dessa nova mudança, com o mesmo regime de operação de antes do blecaute, que o País passará a não precisar mais de despacho termelétrico complementar, uma vez que Itaipu retornará aos níveis de geração anteriores antes do blecaute de novembro passado.

Em resumo, o sistema interligado foi alvo de três contingências ou dificuldades simultâneas, frutos da saída das três linhas de maior tensão operacional do País, os três circuitos de 765KV e 60 Hz de Itaipu. O sistema que então estava sendo operado em regime de duas contingências, com a ocorrência da terceira contingência, entrou em colapso de tensão, com oscilações anormais de frequência. O colapso e as oscilações levaram à separação do Sudeste do sistema Sul, e desligaram, em seguida, os dois bipolos de 600KV de corrente contínua, da geração em 50 Hz de Itaipu, propagando-se os efeitos danosos para parte de outros sistemas.

O que se discute agora é se as contingências, em suas causas básicas, poderiam ter sido evitadas. Ou seja, foram apenas as ocorrências atmosféricas que causaram os três desligamentos, ou houve participação humana neles, não por imperícia operacional, mas por negligência funcional? Como se diz em direito, os fatos jurídicos consequentes se resumem a motivo de força maior ou caso fortuito, tipo de evento irresistível e imprevisível em que não incide a mão humana, ou culpa de gestão econômica, mas não temerária, pois incutia razoável risco previsto?

As partes envolvidas falarão ainda por muito tempo, primeiramente nos autos administrativos da Aneel, e depois, se não houver reconsideração ou cancelamento das multas, nos prováveis autos da justiça federal. Clique aqui para ler o texto completo. (jornal da Energia)

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