segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Energia no escuro

A frequência das falhas no sistema de transmissão de eletricidade e a grande extensão de seus efeitos provoca desconfiança quanto ao funcionamento do setor elétrico. Pode bem ser, é claro, que o blecaute de quarta-feira, que apagou a região Nordeste inteira, tenha sido mesmo desencadeado pelo incêndio em uma fazenda no interior do Piauí --embora o Ibama ponha em dúvida tal explicação. 

No entanto, as causas de desligamentos tão amplos do fornecimento de energia por vezes não se limitam a uma ruptura pontual da rede de transmissão. A própria presidente Dilma Rousseff, com experiência no setor, um dia escarneceu de explicações simplistas, tais como queda de raios. 

Fora do governo, entre especialistas no assunto, tampouco há consenso a respeito de causas dos recorrentes blecautes. Há alguma convergência sobre escassez de linhas de transmissão, o que torna todo o sistema instável. 

Além disso, o atraso na construção de linhas de energia provoca desperdícios irracionais. Por exemplo, parques eólicos no Nordeste estão prontos, mas, devido à inépcia estatal, ficam sem uso. 

Também são alvos de críticas a gestão do sistema, a fiscalização da qualidade do serviço das empresas concessionárias e a dependência de usinas térmicas. 

O gigantesco sistema de energia brasileiro passou quase 20 anos sem manutenção e expansão adequadas, até o racionamento de 2001. As insuficiências do setor novamente parecem gritantes. 

Devido a secas, a capacidade de geração hidrelétrica ficou perigosamente baixa no início do ano. A produção de energia depende de usinas térmicas, caras e poluentes. 

Atrasos no licenciamento ambiental delongam as já vagarosas obras do governo. Há sérias dúvidas sobre a economicidade do modelo atual, que abandonou os grandes lagos, prejudicando o potencial de cada empreendimento. 

Das torres e fios supostamente queimados na fazenda do Piauí ao planejamento de longo prazo, passando pelo gerenciamento regular do sistema, há dúvidas demais. 

Passou da hora de o governo apresentar, além de laudos circunstanciais de acidentes, o contexto em que tais falhas acontecem, até mesmo para informar a opinião pública a respeito das carências e das escolhas disponíveis para lidar com tal escassez. (Folha de S. Paulo / Editorial / 01/09)
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