sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Setor elétrico - indexação e inflação

O governo tem manifestado a intenção de promover uma "desindexação" na econo­mia para reduzir a "inércia inflacionária" e controlar a inflação. Embora haja algumas outras iniciativas visando a reduzir a indexação na econo­mia, o foco do governo tem sido quase que exclusivamente a "desindexação" dos contratos do setor elétrico, tanto dos contratos de concessão a serem re­novados quanto dos novos contratos de compra e venda de energia elétrica. 

A indexação foi um problema grave no Brasil no passado, quando pratica­mente todos os preços eram indexados e o prazo entre reajustes se tomava ca­da vez mais curto. Essa preocupação go­vernamental não é nova. O Plano Real, por exemplo, foi bem-sucedido na redu­ção do grau de indexação na economia e, desde então, o País tem conseguido manter a taxa de inflação anual sob con­trole, em patamares de um dígito. 

Com base nesse contexto, é impor­tante ponderar objetivamente os cus­tos e benefícios da eliminação da inde­xação em contratos de longo prazo, por­que ela proporciona uma série de bene­fícios para a sociedade ao permitir que agentes façam compromissos contra­tuais de décadas com base nos funda­mentos de sua atividade, desconside­rando riscos oriundos das políticas fis­cal e monetária do governo. 

Assim, a desindexação dos contratos do setor elétrico não pode ser uma me­dida tomada de forma impensada. Tal iniciativa requer conhecimento profundo da lógica econômica do setor e deve passar longe de arenas políticas e eleito­rais. O estudo White Paper n.º 9 Inde­xação de Contratos no Setor Elétrico e Inflação (www.acendebrasil.com.br/ estudos) examina a desindexação em detalhes e aponta formas mais promis­soras de alcançar os objetivos atrelados à contenção de ameaças inflacionárias. 

O longo prazo rege toda a lógica do setor elétrico, cujo planejamento está alicerçado em contratos que variam en­tre 15 anos e 35 anos. A desindexação desses contratos forçaria os agentes do setor elétrico a assumir o risco da infla­ção, o que elevaria os custos do setor, seja por causa de prêmio de risco maior, seja pelas distorções no planeja­mento que inevitavelmente ocorre­riam em razão de expectativas diver­gentes quanto ao comportamento futu­ro da inflação ou do encurtamento do prazo dos contratos, 

O recorrente mito ao chamado "índi­ce setorial" também deve ser combati­do. As diferenças nas estruturas de cus­tos entre empresas de energia impli­cam que um índice aderente aos custos de uma determinada empresa destoará dos de outra empresa, inviabilizando um único índice setorial que reflita ade­quadamente os custos de todos os agen­tes do setor. Portanto, a teórica vanta­gem de um índice mais aderente aos custos é facilmente anulada pelo risco prático de se criar um índice que já nas­ce sem credibilidade. 

Se o governo tem convicção da ne­cessidade de reduzir a inércia inflacio­nária, é preciso que as autoridades atuem de forma sistemática para redu­zir a indexação formal e informal na economia como" um todo, sem "esco­lher" quais setores econômicos serão afetados. . 

A medida mais importante para al­cançar esse objetivo é fazer com que a inflação se estabilize em patamar infe­rior ao atual Para isso, é necessário reafirmar o compromisso com o regi­me de metas de inflação, perseguindo permanentemente o centro da meta. E, no médio prazo, reduzir gradual­mente a meta para um patamar mais próximo de zero, com menor banda de tolerância. 

Também é importante atuar para re­duzir a indexação dos principais fato­res de produção: a indexação de salá­rios e do capital e, no caso do setor elé­trico, promover a desindexação do preço do gás natural. 

Em suma, o tema exige conhecimen­to técnico e precisa ser tratado sem viés político. Se a discussão for conduzida de forma descoordenada e casuística, o problema será agravado, com deterioração das expectativas da inflação futura e elevação da demanda por indexação. Será um verdadeiro tiro no pé. Claudio J. D. Sales - PRESIDENTE DO INSTITUTO ACENDE BRA­SIL (O Estado de S. Paulo)

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