Apesar de o ministério de Minas e Energia enfatizar que existe tempo de sobra para definir o desfecho das concessões do setor elétrico que vencem em 2015, o impasse sobre o futuro desses ativos começa a dar sinais de impacto real no mercado de energia brasileiro. A indefinição sobre o tema pode causar, já neste ano, um nó na recontratação de 9.054 megawatts (MW) médios - o equivalente a 15% do mercado elétrico brasileiro - cujo contrato entre geradoras e distribuidoras vence em 2012.
Pela legislação do setor elétrico, a recontratação desse bloco de energia precisa ser feita por um leilão do tipo "A-1" - leilão de compra de energia existente - com início de fornecimento já em janeiro de 2013. O ministério ainda não divulgou a data, nem as regras para a megalicitação, que precisa ocorrer até dezembro, para não causar um colapso no setor elétrico.
O problema é que parte da energia que será descontratada no fim deste ano pertence a usinas cuja concessão será encerrada em 2015. No mercado elétrico, é difícil precisar qual fatia dos 9 mil MW médios pertencem a usinas que se encontram nessa situação. De acordo com estimativas da consultoria PSR, porém, 55% dos 17 mil MW médios que precisam ser recontratados nos próximos três anos estão atrelados a essas usinas.
Na prática, a energia elétrica dos empreendimentos cuja concessão vence nos próximos anos não pode ser comercializada no leilão A-1. Isso ocorre porque os contratos dessa licitação terão oito anos de duração e vão estourar o prazo de encerramento das atuais concessões.
A sensação entre as geradoras e as distribuidoras é de completa incerteza com relação ao futuro dos seus negócios. "O Ministério de Minas e Energia está de portas fechadas. Essa postura diminui o grau de especulação, mas aumenta o percentual de incerteza. O setor está com muita dificuldade", afirmou Marcelo Delgado, diretor da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee).
A expectativa no setor elétrico era de que o governo aprovasse em agosto um pacote para a redução do custo da energia no Brasil. Entre as medidas, estaria a proposta de renovação das concessões do setor elétrico vinculada a uma tarifa mais baixa. Segundo uma fonte ouvida pelo Valor, porém, a presidente Dilma Rousseff quer mais tempo para acertar alguns detalhes sobre o assunto, cujo desfecho pode ficar para setembro ou até depois. Existe ainda a chance de o pacote ser dividido em duas partes: uma relativa à redução de impostos e encargos nas tarifas de energia e outra específica sobre a renovação das concessões.
Pouco mais de 40% de toda o mix de energia atual da Light será descontratado entre 2013 e 2015
Com a necessidade de ganhar tempo para acertar a renovação até o fim do ano e destravar o leilão A-1, ganha força no setor a tese de que a decisão do governo será feita via medida provisória. Assim, o governo garantiria a redução das tarifas e a realização do leilão. E, em seguida, seriam discutidos os detalhes da renovação das concessões.
No fim de julho, durante o último balanço do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) 2, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, sinalizou que o governo renovará as concessões das usinas, condicionando a medida a uma redução da tarifa desses ativos. Essa saída terá impacto direto no leilão, mas não se sabe como será o seu efeito.
Uma das medidas em estudo pelo governo, mas pouco comentada, é negociar a energia das usinas que terão os contratos renovados por meio de cotas a serem pagas pelas distribuidoras, a exemplo do que é feito com a energia de Itaipu.
A proposta, no entanto, não se encaixa na resolução nº 496, aprovada no fim de junho pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). A norma determina que as distribuidoras contratem no leilão A-1 pelo menos 96% do volume de energia existente que ficar descontratado no fim do ano. "Pelo olhar da distribuidora, [a norma] diminuiu o grau de flexibilidade de contratação de energia", ressaltou Delgado.
"A distribuidora deve declarar 96%, mesmo se não houver oferta. Ela [a distribuidora] é muito passiva na relação de compra. Não tem muito o que fazer. Se não houver oferta, ela terá uma exposição involuntária. Mas a regulação prevê que não seja passível de multa", disse o diretor de Energia da Light, Evandro Vasconcelos.
Pouco mais de 40% de toda o mix de energia atual da distribuidora fluminense será descontratado entre 2013 e 2015. A maior preocupação da empresa é com relação ao preço. O valor médio dos contratos que vencem no fim deste ano é de aproximadamente R$ 90/megawatt-hora (MWh). Pela legislação, esse preço pode ser recontratado no A-1 ao teto de R$ 145,47/MWh, valor negociado no leilão de energia nova A-5 de 2008, cujo fornecimento está previsto para começar em 2013. "Se o custo for elevado pode estimular a inadimplência pelos consumidores", explicou o diretor da Light.
A definição do preço da energia no leilão A-1 também trará impactos indiretos ao mercado livre. "Todo o mercado vai ser bastante afetado. Os consumidores livres, quando migram, eles olham para o custo do mercado para trás e veem o mercado para a frente. A decisão terá de ser reavaliada. Não dá para pensar que só o [mercado] cativo será impactado. É algo muito maior. Um quarto de todo o mercado hoje é negociado no ambiente livre", destacou o vice-presidente da comercializadora Comerc Energia, Marcelo Ávila. (Valor Econômico)
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