O debate em torno da maior integração dos sistemas elétricos dos países da América Latina tem ganhado corpo no Brasil, conquistando espaço na agenda do setor, com diversos eventos dedicados exclusivamente à questão. Diversos projetos em países vizinhos -destaque para Peru, Argentina e Guiana- vêm sendo estudados pelo governo, empresas do setor e grandes empreiteiras.
De fato, a integração dos setores elétricos de diferentes países pode trazer benefícios, como custos mais vantajosos às nações que sofrem com a escassez de recursos energéticos e/ou dependem de fontes mais caras, a otimização do potencial elétrico conjunto através da exploração das complementaridades dos sistemas e a viabilização de projetos de baixo custo em países nos quais a demanda é pequena.
Nesse último caso, um país com demanda maior se beneficiaria com a energia gerada a um custo mais baixo na nação vizinha e esta, por sua vez, ganharia com recursos gerados pelo empreendimento que, de outra forma, não se concretizaria.
Pelo peso econômico e grau de desenvolvimento do setor elétrico, o Brasil assumiria um papel de destaque nesse processo.
O país responde por 51% do consumo total de energia da região e anualmente necessita agregar aproximadamente 3.000 MW médios ao sistema.
Contaria a favor também a experiência brasileira na operação do Sistema Interligado Nacional (SIN), que, pela dimensão, possui características continentais com vasta dispersão geográfica dos centros de carga e condições hidrológicas bastante diversificadas, que impõem desafios importantes à gestão da rede.
Contudo, apesar das vantagens, não se pode perder de vista o histórico de problemas das relações bilaterais do Brasil com os países vizinhos em relação ao setor elétrico, o que mostra que os riscos da integração não são desprezíveis. Destacam-se, como casos mais emblemáticos:
1) a nacionalização dos ativos de produção de gás natural na Bolívia;
2) a interrupção da oferta argentina de gás natural contratada pela usina termelétrica de Uruguaiana (RS);
3) o pleito do Paraguai que levou à alteração dos termos do tratado de Itaipu.
Todos esses episódios, além de prejudicado o planejamento do setor, aumentaram os riscos de abastecimento e os custos da energia vendida no país.
Assim, é fundamental avaliar os riscos da integração de forma a evitar que o país volte a se tornar refém de fatores e circunstâncias que fogem ao controle das autoridades que fazem o planejamento do setor elétrico nacional.
Deve-se pesar ainda o fato de o Brasil possuir um vasto potencial energético inexplorado, que nos torna capazes de garantir o próprio abastecimento de energia elétrica sem precisar recorrer a países vizinhos. Autor: Walter De Vitto (Folha de S. Paulo)